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Economia & Energia
Ano XVII-No 90
Julho
/Setembro 2013
ISSN 1518-2932

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Desenvolvimento da Energia Nuclear: Minas e o BRASIL

 

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Desenvolvimento da Energia Nuclear:
Minas e o BRASIL
(antes que me esqueça)

 

À memória de Francisco de Assis Magalhães Gomes e ao 60º aniversário do CDTN, antigo IPR. 

 José Israel Vargas

Em obra, publicada em março do ano passado, organizada pelo meu amigo Márcio Quintão Moreno para comemorar o centenário de nascimento do saudoso mestre, Francisco Magalhães Gomes, que denominei “um cientista de fé”, eu disse, em minha contribuição, que ele foi uma dessas figuras improváveis, que nos surpreendem de tempos em tempos, tão rara costumam ser suas combinações de sensibilidade e vasta cultura humanística, formação técnica de engenheiro, de que tanto se orgulhava nosso amigo.

Vivendo em era de grande euforia, no campo científico, em especial na Física, Magalhães Gomes nunca se conformou com o acanhamento e o atraso das instituições de ensino e pesquisa, sob os quais se formara sua própria geração e que ele se empenhou em modernizar.

Foi indiscutível pioneiro na abertura do campo de estudos das ciências e energia nucleares no Brasil, ciente de que não se tratava apenas de assegurar a produção de energia barata, pois antevia, acertadamente, que a tecnologia nuclear seria propulsora da modernidade, por exigir um elevado nível de excelência em todos os domínios correlatos que mobilizava.

A tudo isso acrescenta-se o legado de ordem moral que dele recebemos: a do intelectual íntegro, do homem generoso, modesto, capaz de se alegrar com o sucesso de quem quer que fosse, comprometido com a verdade da ciência cujo cultivo induzia nos mais moços.

fig2

Uma primeira versão deste trabalho foi apresentada no Simpósio Comemorativo do Centenário de Nascimento de Francisco Assis Magalhães Gomes organizado pelo Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear – CDTN da Comissão Nacional de Energia – CNEN em agosto de 2007 como parte da “3rd World Triga Users Conference”.

1.Introdução

Em 1900, último ano do séc. XIX, Lord Kelvin, em discurso na Associação Britânica para o Progresso da Ciência, notava que todos os grandes problemas da física estavam virtualmente resolvidos, restando, segundo ele, duas exceções:

- A explicação do espectro de emissão do corpo negro;

- A explicação dos resultados da experiência de Michelson e Morley, sobre a velocidade da luz relativa ao movimento da terra, (do éter).

Como sabemos, a solução desses dois problemas citados por Kelvin, além da explicação dos fenômenos da radioatividade (ref 1) e do efeito fotoelétrico (ref 2), levaram à grande revolução da ciência do século XX, com o desenvolvimento da Mecânica Quântica, da Teoria da Relatividade e à emergência da Física Nuclear. Neste tempo ocorreram muitas outras importantes descobertas, entre as quais a da fissão do núcleo atômico pelos químicos O. Hahn e F. Strassmann.

Essa última descoberta veio, mais tarde, por sua vez, revolucionar a redistribuição do poder político e econômico no mundo e suscitar graves problemas que, receamos, continuarão para sempre a acompanhar a espécie humana, como bem testemunham os acontecimentos que permeiam atualmente o dia a dia da conjuntura internacional (ref 3).

Magalhães Gomes era consciente de que a implementação de qualquer programa nuclear independente pressupõe o desenvolvimento do ciclo do combustível, que implica:

1°) sucesso nas pesquisas minerais e geológicas do urânio e do tório, bem como de outros materiais de interesse, até à produção dos próprios elementos combustíveis, contendo ou não urânio enriquecido do isótopo de massa 235, ou do plutônio 239, este, como se sabe, artificialmente produzido a partir do urânio 238;

2°) o domínio completo das engenharias de projeto, de processo e de produção dos materiais relevantes;

3°) a definição das  dimensões, e da economicidade, das usinas a serem eventualmente implantadas, comparativamente a outras opções existentes para o atendimento das demandas energéticas futuras; e, finalmente,

4°) a mais longo prazo, exige a definição dos meios a serem adotados para a estocagem após reprocessamento dos combustíveis, já utilizados durante a vida das centrais geradoras de resíduos altamente radioativos (que emitem radiações por várias centenas de anos).

A Política Nuclear Brasileira tentou, desde 1946, com maior ou menor sucesso, percorrer quase todas essas etapas. Como veremos, ela foi precedida, já antes da última guerra mundial, pelo desenvolvi-mento, ainda que incipiente, (no setor aplicado) tanto de recursos humanos na área da física nuclear básica, como no campo da busca de materiais radioativos, entre os quais naturalmente o urânio (fonte de uma das 3 séries radioativas naturais), que se tornaria indispensável ao desenvolvimento futuro do setor. Essa tradição, posto que limitada, propiciou o surgimento de líderes, que iriam alimentar a esperança de sucesso nacional, no domínio da nova tecnologia energética.

No Brasil, de fato, tanto a descoberta precoce da ocorrência da radioatividade nas águas hidrominerais (notadamente em Poços de Caldas e mais tarde em Araxá, ambas em Minas Gerais), indicadores da ocorrência de importantes materiais nucleares (ref 4), foi contemporânea dos conhecidos avanços na França, na Alemanha, na Inglaterra e na Itália, neste setor. Deste último país provieram Gleb Wataghin e Giuseppe Occhialini, mestres da geração de jovens patrícios que foram, em São Paulo, os pioneiros da Física Nuclear brasileira (ref 4).

Uma menção especial deve ser feita a Bernard Gross, que no Rio de Janeiro, iniciou entre nós, já em 1934, o estudo das radiações cósmicas, na Divisão de Eletricidade e Medidas Elétricas do INT. Os cientistas Marcelo Damy de Souza Santos e Joaquim Costa Ribeiro iriam participar da primeira comissão, criada a 20 de janeiro de 1947, que se ocupou oficialmente do controle e fiscalização de materiais estratégicos (CFME) no âmbito do Conselho de Segurança Nacional. Muitos desses materiais, como vimos, já haviam tido sua ocorrência verificada entre nós, principalmente pelo grupo de geologia e geoquímica, criado em Minas Gerais pelo grande geólogo Djalma Guimarães. Ele, de fato, havia descrito, já em 1929, a ocorrência de urânio associado a nióbio-tantalatos  (ref 5), em S. João Del Rei.

Incidentalmente, esses trabalhos refletiram a influência do grande Viktor Goldschmidt, líder do importante grupo que criara na Universidade de Göttingen, tendo sido ele o verdadeiro pai da moderna geoquímica, em ousada e inovadora descrição da distribuição dos elementos químicos na crosta terrestre. Djalma Guimarães, sabe-se hoje, mantinha estreitas relações com os pesquisadores alemães, através de correspondência continuada com C. W. Correns, membro proeminente da escola de Göttingen. Testemunho desses contatos, bem como dos inúmeros trabalhos realizados pelo grupo mineiro sobre os materiais nucleares, ao longo das décadas subsequentes, estão descritos no notável levantamento histórico publicado por Cláudio V. Dutra, um dos mais distintos participantes do referido grupo (ref 6). Recorde-se que os trabalhos desses pioneiros levaram à descoberta das importantes reservas de fosfato nas cidades mineiras de Patos, Araxá e Patrocínio, bem como do nióbio de Araxá, de imenso valor econômico e estratégico para o País. Recentemente o MCTI comemorou o desenvolvimento do Zircalloy, para a fabricação de elementos combustíveis. As ligas de nióbio seriam igualmente utilizáveis para o mesmo fim.

Antes dos anos 40, e também mais tarde, analogamente ao ocorrido com o grupo mineiro, muito contribuíram nessa área pesquisadores tanto de São Paulo quanto do Rio de Janeiro. Desse período, cabe citar principalmente, os nomes de Francisco Maffei e Luiz Cintra do Prado (São Paulo), Irnack Carvalho do Amaral, Elisiário Távora, Alexandre Girotto, Sílvio Fróes de Abreu e o já mencionado Bernardo Gross.

O ímpeto de todos esses trabalhos foi notavel-mente acelerado graças às influências do Almirante Álvaro Alberto da Motta e Silva e de César Lattes, o co-descobridor do méson µ (ref 7). O primeiro representou o Brasil, em 1946, na recém criada Comissão de Energia Atômica das Nações Unidas. Esta comissão buscou regulamentar a produção e as consequências políticas resultantes do uso da nova forma de energia e a promoção da internacionalização e controle de todos materiais nucleares (Plano Baruch), repelido pelo Brasil. Ele contribuiu também, decisivamente, para a formulação da chamada cláusula das “compensações específicas”, destinada a regular o fornecimento em troca de materiais de interesse nuclear aos países industrializados, notadamente pelos países em desenvolvimento, detentores de reservas mais importantes de U.

É provável que a posição do Almirante Álvaro Alberto, bem como a de seus colegas brasileiros, tenha, a curtíssimo prazo, sido fortemente influenciada pela difusão, a 12 de agosto de 1945, do Relatório Smyth, que, surpreendentemente, tornou públicas, decorridos apenas seis dias da explosão da bomba atômica em Hiroxima, importantes informações sobre o programa americano de uso militar da energia nuclear (ref 8). Já na introdução, esse trabalho recorda que a aplicação da equação E = mc2 demonstra que a transformação de 1kg de massa em energia seria três bilhões de vezes superior à que se obtém pela queima de 1kg de carvão mineral, o combustível mais correntemente utilizado a partir da revolução industrial iniciada no séc. XIX.

Possivelmente foram as valiosíssimas informações contidas nesse relatório que levaram o Conselho de Segurança Nacional a criar, logo no início de 1947, a já referida CEFME (Comissão de Estudos e Fiscalização de Materiais Estratégicos). Ela foi de pronto capaz de definir, como sendo de interesse para a energia nuclear, o urânio e o tório, além do lítio, do berilo, do boro, do cádmio, do grafite e mesmo do chumbo radiogênico (Nota 1). A comissão decidiu que os minérios da maioria desses elementos, juntamente com os de nióbio e zircônio, teriam sua exploração, comércio e fiscalização rigidamente controlados. Mais tarde, decidiu-se ainda que no caso em que o urânio e/ou o tório fossem componentes minoritários de determinado minério, como no caso do minério de nióbio de Araxá (que contém cerca de 2% de tório), descoberto por Djalma Guimarães, o eventual explorador obrigava-se a devolver ao governo, sem ônus para este, o equivalente desses elementos, na forma de compostos químicos puros (ref 9). Esta decisão foi adotada por sugestão da Comissão presidida pelo Prof. Francisco Magalhães Gomes, pelo Prof. Joaquim Maia (Universidade de Ouro Preto), pelo Prof. José Israel Vargas e pelo Engenheiro Luiz de Oliveira Castro.

Paralelamente, muito contribuiu para nossa política nuclear a grande repercussão internacional que teve a descoberta do méson, de que participou César Lattes. Imaginava-se que o méson pudesse catalisar a fusão nuclear através da reação do próton com o deutério, gerando 5,5 Mev de energia por evento. Essa reação, caso factível, seria capaz de gerar energia nuclear mais limpa do que a proveniente da fissão do urânio. Infelizmente tais expectativas não se realizaram (ref 10).

2. O papel do CNPq

A constatação das notórias insuficiências de nosso País em recursos humanos, bem como de sua infraestrutura de pesquisas, levou o Almirante Álvaro Alberto e César Lattes, apoiados por outros cientistas, a propor a criação do Conselho Nacional de Pesquisas, efetivada através da lei 1.310, de 15 de janeiro de 1951, e do qual Álvaro Alberto foi o primeiro presidente. Foi ele também quem propôs, em 1950, a medida concretizada no decreto-lei 150, que reforçou as limitações já estabelecidas ao comércio de materiais estratégicos, notadamente do urânio e do tório. Em consequência desse instrumento, o comércio desses elementos passou a ser realizável somente em operações de governo a governo. O ato constituiu, segundo Ninon Machado, uma antecipação do monopólio de todas as atividades nucleares estabelecidas, como se verá adiante, que viria a imperar até os nossos dias (ref 11).

O CNPq, além da atribuição de fomentar as atividades de pesquisa e desenvolvimento, pela formação de recursos humanos no País e no exterior, deveria ocupar-se de rígido controle e fiscalização dos materiais anteriormente referidos, recorrendo ao decreto-lei 438, de 1938, cujas duras penalidades passaram a ameaçar os infratores da lei 1.310.

Subsequentemente criou-se uma Comissão de Energia Atômica no âmbito do próprio Conselho Nacional de Pesquisas, composta por doze membros, representantes tanto do governo quanto da comunidade científica (Nota 2). Ela logo ensejou o estabelecimento de laços de cooperação com os Estados Unidos e com a França, notadamente através da companhia francesa “Société des Produits Chimiques des Terres Rares”. Isso permitiu realizar aprofundados estudos sobre a extração do urânio contido na caldasita de Poços de Caldas. Para tal fim foi enviado à França, pelo CNPq, um grupo de químicos chefiados por Alexandre Girotto, que conseguiu produzir as primeiras 900g de urânio metálico, proveniente de um minério brasileiro. O processo utilizado foi objeto de Patente Internacional, em nome do CNPq (ref 12).

O acordo com os americanos propiciou a realização de pesquisas de minerais nucleares, em várias áreas do País, principalmente em Minas Gerais, pelos geólogos Max White e Gene Tolbert. Essa cooperação contou, frequentemente, com a presença de outros técnicos do U.S. Geological Survey (ref 10).

A pesquisa de minerais atômicos prosseguiu, tanto em colaboração com a França quanto sob a égide da Comissão de Energia Nuclear, sob a orientação de Elisiário Távora, e da futura NUCLEBRÁS. As reservas resultantes desses vários trabalhos, bem como dos realizados nessa empresa, sob a direção de John Milne de Albuquerque Forman, permitiram ao Brasil dispor hoje da sexta maior reserva de urânio do mundo (ref 13).

As ocorrências conhecidas de Urânio no Brasil estão na parte oriental do país e são as seguintes (comunicação pessoal do Prof. Umberto Cordani): as duas principais, Lagoa Real (Caetité, Ba) e Itatatia (Santa Quitéria, Ce) situam-se em áreas de rochas antigas do embasamento (idades acima de 1800 Ma), mas que foram aquecidas e  reativadas tectonicamente por volta de 500-600 Ma. Os minerais uraníferos devem ter sido formados nessa última época. O mesmo vale para a ocorrência de Espinharas (PB) e talvez para a de Amorinópolis (Go).

A ocorrência de Moeda, no Quadrilátero Ferrífero, perto de Belo Horizonte, situa-se em meta-conglomerado do Grupo Minas, com idade de cerca 2400 Ma. É possível que o mineral de Urânio tenha idade similar.

A ocorrência de Poços de Caldas situa-se no interior de um maciço vulcânico com cerca de 80 Ma, e os minerais uraníferos devem ser pouco mais jovens.

A ocorrência de Figueira (Pr) situa-se na Bacia do Paraná, em  arenitos com cerca de 300 Ma. Os minerais uraníferos são mais novos, e talvez estejam associados aos derrames de basalto com cerca de 130 Ma. (ref 14).

Paralelamente às ações iniciais na área de materiais, o CNPq - subordinado diretamente à Presidência da República - apoiou-se tanto no Departamento de Física da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (fundada em 1934), quanto no próprio Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, criado em 1949 por César Lattes, José Leite Lopes e Jaime Tiomno, para iniciar a implantação no País de variadas infraestruturas de pesquisa. Além de trabalhos sobre radiação cósmica e física nuclear teórica, o CBPF ocupou-se pioneiramente de física da matéria condensada e de química nuclear, particularmente das aplicações do efeito Mossbauer. Os dois últimos campos estiveram sob a liderança de Jacques Danon.

Instalaram-se, a partir de 1951, em São Paulo, um acelerador betatron (Marcello Damy) e um gerador eletrostático do tipo Van Der Graff (Oscar Salla); no Rio de Janeiro, um acelerador Cockcroft-Walton e a montagem, por iniciativa de C. Lattes, porém nunca concluída, de um ciclotron de energia reduzida junto ao Arsenal da Marinha. A estas iniciativas, seguiu-se a fundação, em 1952, do Instituto de Pesquisas Radioativas, na Universidade de Minas Gerais, sob a liderança de Francisco Magalhães Gomes.  Criou-se em 1956 o Instituto de Energia Atômica, em São Paulo, sob a direção de Marcelo Damy de Souza Santos; mais tarde instalou-se o Instituto de Engenharia Nuclear, no Rio de Janeiro, diretamente subordinado à CNEN.

Beneficiaram-se igualmente do programa os jovens físicos gaúchos Gerhard Jakob, Darcy Dillenburg e Fernando Zawislawski, que trabalharam no IPEN sob a direção do Professor Marcelo Damy e no Departamento de Física da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, sob a orientação do Professor Oscar Salla. O grupo gaúcho da UFRS ampliou-se consideravelmente com a presença do ilustre físico teórico alemão Theodor Maris e de outros cientistas estrangeiros.

O IPR ocupou-se, inicialmente, de trabalhos nas áreas da eletrônica nuclear (Eduardo Schmidt Monteiro de Castro; Magalhães Gomes, era professor de física, tanto na Escola de Engenharia quanto na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de Minas Gerais); da prospecção e análise física de minérios e materiais nucleares (Cassio de Mendonça e Willer Florêncio). Usou-se também a técnica das emulsões nucleares, desenvolvida em Bristol e aplicada com grande êxito por César Lattes, em suas pesquisas pioneiras na área da física das altas energias (raios cósmicos) (ref 10) Milton Vieira Campos ocupava-se de estudos radioquímicos (após estágio em Chicago); Cássio Mendonça Pinto, (ex-colaborador de Fritz Feigel, no DNPM), catedrático de química inorgânica da Escola de Engenharia e de físico-química na Faculdade de Filosofia, desenvolveu vários métodos originais para a análise de minérios complexos de urânio e de nióbio. Foram logo enviados para treinamento no exterior vários jovens químicos, físicos, engenheiros e matemáticos, incluindo o autor deste trabalho, que freqüentou no Chile o primeiro curso de química nuclear da América Latina, ministrado por Alfred G. Maddock, seu futuro orientador de doutorado na Universidade de Cambridge.

3. O programa Átomos para a Paz e a situação internacional do setor nuclear

Os três institutos vieram logo a beneficiar-se do programa “Átomos para a Paz”, lançado pelo Presidente Eisenhower, em 1953. Foram instalados três reatores nucleares de pesquisa, em São Paulo (IEA), em Minas Gerais (IPR) e no Rio de Janeiro (IEN), respectivamente em 1957, 1960 e 1961. Esses equipamentos desempenharam importante papel no desenvolvimento das aplicações das técnicas nucleares entre nós, notadamente nas áreas da utilização dos isótopos radioativos na indústria, na química nuclear, na radioproteção e na medicina. Permitiram também o treinamento de pessoal que, mais tarde, constituiria os grupos de estudos e projetos de Engenharia Nuclear. Menção especial merece o trabalho do Grupo de Reatores de Potência (GRP) criado no âmbito da CNEN, que contou, a partir de 1962, com a estreita cooperação francesa. Ele foi dirigido pelo professor Jonas Santos, da Escola Nacional de Engenharia da Universidade do Brasil.

A potência dos reatores de Minas Gerais e de São Paulo, inicialmente limitadas a 30 e a 1000 kw (5000 kw nominais) respectivamente, foram aumentadas depois para cerca de 250 e 3.000 kw. O reator Argonauta do Instituto de Engenharia Nuclear do Rio de Janeiro manteve sua potência original de 10kw, juntando-se a ele, mais tarde, um cíclotron de baixa energia, utilizado para a produção de isótopos de interesse para a medicina nuclear. A experiência rapidamente adquirida com o funcionamento dos reatores, nas várias áreas já mencionadas, pode ser notada nas numerosas comunicações apresentadas na reunião patrocinada pela Agência Internacional de Energia Atômica, em São Paulo, em 1963, sobre Utilization of Research Reactors (ref 16). A delegação brasileira à referida reunião contou com 76 participantes.

4. A criação da CNEN (1956 e 1962) e as relações do Brasil com a Agência Internacional de Energia Atômica.

No plano institucional, foi criada em 1956, pelo decreto presidencial 4.011 e após amplo debate público durante a administração Kubitschek, a Comissão Nacional de Energia Nuclear, diretamente vinculada à presidência da República. Ela sucedeu à comissão anteriormente estabelecida no CNPq, tornando-se independente desse órgão, porém mantendo a já mencionada vinculação. Tal subordinação demonstrava o caráter estratégico atribuído ao setor nuclear pelo Governo. Essa subordinação foi confirmada pela lei 4.118, de 1962, apesar de o setor ter sofrido profundas modificações, até à adoção da atual estrutura, estabelecida pela lei 10.683, de 28 de maio de 2003, a qual é mostrada na Figura1. A variada subordinação da CNEN nos últimos 47 anos está descrita na Nota 3.

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Figura 1 - Estrutura do Setor Nuclear Brasileiro.

As relações internacionais prosseguem, nessa altura, sempre com a França e os Estados Unidos.  Com este último país elas foram iniciadas em 1952, renovadas em 1954, mas se extinguiram na prática em 1956, por não haver aquele país cumprido as “compensações específicas” correspondentes ao fornecimento que lhe faria o Brasil de 100 toneladas de tório.

Essa política de compensações específicas foi reafirmada mais tarde, em 1962, com o estabelecimento definitivo do monopólio estatal das atividades nucleares pela CNEN, criada pela lei 4.118 de 1962. Registre-se que a interrupção das exportações de urânio e tório para os Estados Unidos obedeceu também às recomendações formuladas em estudos, já realizados pela Comissão de Exportação de Materiais Estratégicos, criada pelo governo para tal fim, sob a presidência do Ministro das Relações Exteriores.

Essas iniciativas resultaram da crescente conscientização de que tanto a existência das armas nucleares como a produção industrial de energia, por via da fissão nuclear, que se estimava iria intensificar-se, teriam profundas repercussões na distribuição e realinhamento futuros do poder político e econômico mundial.

Inicialmente, note-se que os Estados Unidos e a Grã-Bretanha (que teve, por largo tempo, papel destacado não só nas pesquisas básicas que serviriam ao aproveitamento militar e civil da energia nuclear, mas participou dela também a França, pela presença de vários cientistas egressos do Grupo de Fréderic Joliot-Curie, na produção do primeiro artefato nuclear). Os países pioneiros logo tentaram estabelecer um sistema de controle internacional sobre todos os aspectos relativos ao uso da nova energia. Tal controle incluía, como já se apontou, os próprios jazimentos uraníferos, existentes ou a serem descobertos mundo afora. Tais iniciativas fracassaram, seja pela predominância de interesses nacionais de outros países industrializados, seja em decorrência da polarização ideológica que já se tornava evidente ao fim da segunda guerra, e que dividiu o mundo, até 1990, em dois blocos antagônicos, sob a liderança das duas superpotências que emergiram do conflito – os Estados Unidos e a União Soviética.

O Brasil, como a maioria dos países, manifestou-se na Comissão de Energia Atômica da ONU, pela voz do Almirante Álvaro Alberto, contrário a tais iniciativas de controle, por estimá-las atentatórias à soberania nacional. A partir daí, nosso País buscou sistematicamente o desenvolvimento próprio, que deveria, no entanto, contar com a cooperação internacional. Inicialmente foi escolhida, como já referido, as parcerias americana e francesa (Nota 4).

5. A AIEA e a evolução do sistema internacional de salvaguardas.  O papel do Brasil. A cooperação com a França

O monopólio das armas nucleares tendo sido rompido, inicialmente pela União Soviética (1949), depois pela Inglaterra (1952), França (1960) e China (1960), estava ampliado o clube atômico militar, constituído, como vimos, inicialmente somente pelos Estados Unidos, Inglaterra e URSS, todos membros do Conselho de Segurança da ONU. Nele, entenderam-se os contendores principais da corrida armamentista - as duas superpotências - superando assim suas profundas divergências ideológicas e políticas, com vista à manutenção do monopólio dos conhecimentos nucleares. Essa política, sob o argumento de que a proliferação de tais conhecimentos levaria, fatalmente, ao desenvolvimento das próprias armas nucleares, estabeleceria inexoravelmente, segundo eles, a acelerada multiplicação de novos centros de poder, com o aumento do perigo potencial de desencadear-se corrida armamentista, que fatalmente levaria à eclosão de guerra nuclear generalizada.

Remonta, pois, ao imediato pós-guerra o início de toda uma série de iniciativas destinadas a lidar com o espinhoso problema criado pelo crescente domínio científico e técnico do núcleo atômico, circunscrevendo-o na medida do possível. De um lado, procurou-se negociar meios e modos de pôr fim à corrida armamentista. Essa questão, que ainda constitui o cerne da atual problemática internacional, teve somente sucesso relativo. De fato, os gastos militares dos principais contendores dos dois blocos, em que se dividiam as nações, continuaram a crescer astronomicamente, e chegaram a alcançar somas bem superiores a US$ 1 trilhão anuais (dólares de 1955).

De outro lado, é certo que foram tomadas várias iniciativas no sentido de promover acordos internacionais destinados a obstar a proliferação nuclear.

Resultou disso, num primeiro tempo, o lançamento em 1953, do programa Átomos para a Paz, pelo qual os Estados Unidos forneceriam a outros países apenas reatores nucleares de pesquisa. Apesar do pequeno porte e caráter estritamente pacífico destes equipamentos, eles ficariam submetidos a estrito controle do fornecedor.

Para complementar e ampliar tal restrição, foi criada, a 2 de outubro de 1956 e por inspiração daquele país,  apoiado pela comunidade internacional, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), sediada em Viena. Ela teria, além do objetivo referido, o mandato de promover, em benefício de todos, o uso pacífico da energia atômica. O seu comitê organizador foi presidido pelo embaixador do Brasil, Luiz Carlos Bernardes.

A Agência, a despeito de ter-se tornado útil e importante fórum de negociações moderadoras das tensões Leste/Oeste, constituiu-se logo em instrumento internacional de um sistema de salvaguardas que veio de fato dificultar a generalização do uso pacífico da energia nuclear. Essa postura revelou-se contrária ao espírito que supostamente levara à sua criação. Para agravar ainda mais esse quadro e por mútua “concertação” dos países industrializados, a Agência teve seu regulamento básico revisto, de modo a impedi-la de financiar bens de capital, indispensáveis, como sabemos, à implementação de programas nucleares exclusivamente dedicados à produção de energia elétrica, em países destituídos tanto de capitais quanto da sofisticada base industrial exigida para essa produção. O sistema de salvaguardas, de cuja formulação ampliada participou em 1962-1963 o presente autor, em nome do Brasil, estabeleceu o controle internacional sobre produtos, processos e informações nucleares, a serem intercambiados tanto no plano multilateral quanto no bilateral; também gerou o conceito de “contaminação” de quaisquer componentes, mesmo os mais convencionais, que fizessem parte das instalações submetidas ao regime de salvaguardas. Para tanto, a Agência Internacional de Energia Atômica criou um complexo sistema internacional de inspeção, encarregado de garantir a aplicação de suas exigências.

Os países industrializados, tendo à frente os membros do clube atômico, insatisfeitos com a ação julgada ainda insuficiente da Agência de Viena, propuseram, em 1968, o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), que engajaria seus signatários à proscrição, em seus países, de todas as atividades que pudessem ensejar, de qualquer modo, aplicações militares (Nota 5).  Esse engajamento incluiu o reforço da inspeção internacional de todas as instalações dos países membros da AIEA, com exceção dos detentores de armas nucleares.

Tal mecanismo vem sendo ampliado paulatinamente, por via dos chamados Protocolos Adicionais aos acordos de salvaguardas e, portanto, ao próprio TNP, pela Conferência Geral da AIEA, o órgão máximo dessa organização, subordinado ao Conselho de Segurança da ONU.

Os proponentes do Tratado acenavam aos eventuais signatários desse acordo diplomático com a vantajosa ampliação de facilidades de acesso às aplicações pacíficas do átomo, prometendo, em contrapartida, a crescente promoção de seu próprio desarmamento. Resultaram ilusórias tais “vantagens” que, em nenhum caso, foram completamente efetivadas, a não ser, muito tardia e timidamente, pela celebração de acordos parciais de desarmamento, firmados entre as duas superpotências, e que foram parcialmente ab-rogados pela administração Bush e mantidos na atual administração da superpotência restante (Nota 6).

Além desses instrumentos, estabeleceu-se no âmbito da América Latina e Caribe, em 1967, o Tratado de Tlatelolco, precursor do TNP, destinado a promover a proscrição de armas atômicas em nossa área. Esse tratado sofreu várias peripécias. Ele deveria envolver não só os países da região e as cinco grandes potências com assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como também aqueles países que contassem, na área, com territórios sob sua tutela. Durante longo tempo não o assinariam Cuba e França; a Argentina não o ratificava. As grandes potências assinaram-no com reservas inaceitáveis: os Estados Unidos e a Grã-Bretanha reservando-se o direito de transportar armas na região, com o que não concordaram a União Soviética e a China. Além disso, os Estados Unidos e a União Soviética condicionavam a observância desse instrumento diplomático (que autorizava a realização de explosões nucleares com fins pacíficos) à possibilidade de futuro desenvolvimento de métodos capazes de distinguir entre tais explosões e as que tivessem objetivos militares. Como sabemos, essa opção de uso de explosões nucleares, ditas pacíficas, não prosperou, com o banimento, já em outubro de 1963, por acordo internacional, dos testes com artefatos nucleares, pacíficos ou bélicos.

O Tratado de Tlatelolco na prática tornou-se inoperante, até que, finalmente, emendas oferecidas pela Argentina, Brasil e Chile, incluíram em seus dispositivos os princípios contidos no regime geral de inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica, permitindo sua ratificação definitiva, inclusive pelo Brasil, através do decreto 1.246, de 16 de setembro de 1994.

Registre-se ainda que os países detentores da tecnologia vêm promulgando legislações nacionais, ainda mais restritivas do que as já existentes, à transferência de tecnologia.  Tais restrições, que, como sabemos, são de difícil implementação, estenderam-se paulatinamente aos campos das tecnologias espaciais, químicas e biológicas (as chamadas tecnologias duais).

De qualquer modo, teve prosseguimento, até o fim dos anos 90, a desenfreada corrida armamentista característica da Guerra Fria, quando se instalou o denominado “equilíbrio do terror” Leste/Oeste, que durou até à relativa distensão que se seguiu, particularmente, ao fim da Guerra do Vietnã (1972). Ela foi posteriormente intensificada pelo desmantelamento da União Soviética, permitindo o estabelecimento entre ela e os Estados Unidos de vários acordos destinados sucessivamente a interromper, como vimos, as experiências com bombas nucleares, tanto na atmosfera quanto no subsolo. Isso permitiu, ademais,  o desmantelamento progressivo ainda que parcial, dos foguetes intercontinentais pelos tratados Salt I e Salt II,  assinados entre fevereiro de 1971 e setembro de 1996. Nesta última data foi assinado, por 155 países, o Tratado de Proibição de Testes Nucleares, não subscrito, todavia, por Índia, Paquistão e Coréia do Norte. De outra parte, Israel não aderiu ao TNP de julho de 1968, acompanhado pela Índia e Paquistão.

Com o fim da Guerra Fria, esperava-se que o término do sistema bipolar de poder eliminasse os imensos gastos realizados na corrida armamentista, direcionando-os para a promoção do desenvolvimento geral. Tal esperança, contrariando as melhores expectativas dos países mais pobres, frustrou-se. Em vez disto, instalou-se um sistema multipolar de poder, atualmente constituído por nove países nuclearizados: Estados Unidos, Inglaterra, Rússia, China, Paquistão, Índia, Israel, França e Coréia do Norte, todos eles perigosamente marcados pelas mais diversas e conflitantes visões políticas e religiosas.

Agrava-se, pois, perigosamente, a conjuntura internacional, particularmente no Oriente Médio, onde a intenção atribuída ao Irã, (com violação ao TNP, de que é signatário) de estar tentando desenvolver armas atômicas, pode gerar conflito que, ultrapassando a região, adquira proporções catastróficas. Ela é reminiscente da crise gerada em outubro de 1963 pela instalação em Cuba de bases de lançamento de foguetes de médio alcance, munidos de ogivas nucleares, que nos aproximou a todos, perigosamente, da guerra termonuclear, de consequências imprevisíveis.

Nesse contexto, torna-se exemplar e atualíssimo o acordo entre o Brasil e a Argentina destinado a promover a inspeção mútua de suas atividades nucleares. Ele foi sugerido pelo relatório de Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro de 1986, e que propiciou a criação da Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC) (ref 17); ver também a propósito Notas 5 e 6. Essa Agência binacional foi inaugurada em 12 de dezembro de 1991, com a posse do seu primeiro secretário, o argentino Jorge Coll que assinou no dia seguinte em Viena o Acordo Quadripartito entre Brasil, Argentina, AIEA e a ABACC. Esse Acordo estabelecia um regime de salvaguardas nos dois países, que era análogo ao vigente para países que haviam aderido ao TNP. Nos cinco anos seguintes ou se uma série de entendimentos e encontros destinados à avaliação da capacidade nuclear dos dois países enquanto a ABACC já aplicava salvaguardas em todas as instalações dos dois países, inclusive as militares. A ratificação pelo nosso País do Acordo Quadripartito efetivou-se finalmente pelo decreto legislativo 11, de 9 de fevereiro 1994, sendo regulamentado pelo decreto presidencial 1.065, de 24 de fevereiro do mesmo ano.

Apesar de suas reservas quanto ao caráter discriminatório do TNP, pelas razões já apontadas, o Brasil veio, no entanto, finalmente a apoiá-lo, ratificando-o em 1997, embora já houvesse incluído em sua Constituição Federal de 1988 dispositivos que excluem o uso da energia nuclear para fins bélicos.

A importância já adquirida pela energia nuclear pode ser avaliada, atualmente, pelo funcionamento de 442 centrais núcleo-elétricas, em 30 países, com potência instalada de 369 GWe, conforme mostra o Gráfico XI – alcançando cerca de 15% da energia elétrica gerada a nível mundial.

Justificaram-se pois as tentativas de implementação de um programa nuclear independente, para desenvolver tecnologia portadora de futuro, em obediência às diretrizes traçadas para o setor pelo Conselho de Segurança Nacional. De acordo com essas diretrizes, a Administração Federal, como já referido, optara nas circunstâncias vigentes, pelo uso do urânio natural como o combustível mais adequado à alimentação de nossas futuras centrais.

 Essa opção baseou-se nas experiências pioneiras da Inglaterra (instalação do reator de Calder Hall, de 100MW), e da França (centrais de Chinon, de mesma potência, no Vale do Loire). A escolha afigurava-se como a que melhor poderia atender ao nosso País não só no plano técnico, como também no plano político. De fato, a França, que se afirmava ciosa de sua independência, e que ansiava retornar à situação de prestígio e liderança que desfrutara nas pesquisas nucleares do pré-guerra (tendo mesmo patenteado a concepção técnica do reator nuclear, que viria a ser desenvolvido por Fermi, em 1941), ignorava, como o Brasil, os obstáculos à transferência de tecnologia, criados, mesmo para uso civil, pela AIEA.

Aquele país mostrava-se, pois, disposto a cooperar estreitamente com nosso País para desenvolver as centrais nucleares do tipo apontado. O Grupo de Trabalho sobre Reatores de Potência (GTRP), já mencionado, pretendia desenvolver projeto completo de um reator de 100MW, com a participação de técnicos franceses de alto nível.

A cooperação cobria, de forma abrangente, todos os setores do programa. Além das áreas técnicas, desenvolveu-se no campo científico intenso intercâmbio entre instituições brasileiras e francesas (envolvendo o Centro de Estudos Nucleares de Grenoble e o Laboratório Nacional de Saclay, em Paris). Esta cooperação desenvolvida, principalmente entre 1961 e 1979, contou com a participação de eminentes personalidades científicas francesas. Como já mencionado, o diretor de Saclay, Jean Debiesse, o diretor de CEN de Grenoble, Pierre Balligand, mais tarde Comissário da Energia Atômica da França; de Michel Soutif, reitor da Universidade de Grenoble, seguido pela permanência, durante um ano, na UFMG do professor André Moussa, chefe do Laboratório de Química Nuclear, e de Daniel Dautreppe, chefe da Divisão de Estudos Fundamentais; do chefe do Laboratório de Ressonância Magnética Nuclear, Pierre Servoz-Gavin. Estiveram também, durante um ano, o físico do CNRS André Baudry, bem como os jovens cooperantes Paul Vuillet, Pierre Boyer, Alan Chappe, Christian Jeandey, além de madame Pierrette Auric.

A instabilidade política e econômica vigente no Brasil e a mudança do quadro de nossas relações internacionais, decorrentes do golpe de Estado de 1964, interromperam esse processo de apropriação da tecnologia francesa. Recorde-se ainda que tanto a França como a Inglaterra abandonariam na mesma época a linha urânio natural-gás-grafita em virtude da decisão daqueles países de desenvolverem submarinos nucleares, para cuja propulsão necessitavam a tecnologia americana de reatores alimentados a urânio enriquecido e moderados  e refrigerados por água pressurizada.

6. O Grupo do Tório

De 1965 a 1973, face à indefinição das autoridades federais sobre a linha a ser adotada para o desenvolvimento do Programa Nuclear e em consequência do apontado abandono da linha urânio natural pela Inglaterra e pela França, nossa parceira maior, criou-se, no IPR, o chamado Grupo do Tório. Este objetivava, em concepção original, utilizar o tório, abundante em nosso País, associando-o ao urânio natural, para a produção independente de energia núcleo-elétrica. Elaborou-se um projeto de referência para um reator de 30MW, alimentado por urânio natural e tório e moderado a água pesada. Esse projeto serviria ao desenvolvimento de três outras opções: o Projeto Instinto, elaborado em 1966 e 1967 (urânio enriquecido - tório - água pesada); o Projeto Toruna, de 1968 a 1971 (urânio natural - água pesada); finalmente, de 1971 a 1973 ocupou-se o grupo também do Projeto Pluto (plutônio-tório - água pesada). Esses conceitos e projetos estão descritos em três publicações da Agência Internacional de Energia Atômica. O primeiro, Thorium-cycle possibilities in the Brazilian nuclear program (ref 18) o segundo, “The INSTINTO Project – A status and progress report on the thorium reactor development program” (ref 19) e, finalmente, o terceiro, “Preliminary assessment of heavy-water thorium reactors in the Brazilian Nuclear Program” (ref 20).

Esses estudos contaram com o apoio do Comissariado de Energia Atômica da França, da Alemanha, da Suécia e a participação de membros do Instituto de Engenharia Nuclear (IEN) do Rio de Janeiro, através dos engenheiros Luiz Osório de Brito Aghina e J.A. Nóbrega, em física de reatores, e J. Ribeiro da Costa, em engenharia estrutural. Trabalhou em Saclay, França, o engenheiro Ricardo B. Pinheiro, do Grupo do Tório do IPR, na equipe dirigida por Roger Naudet e constituída por Marcel Chabrillac, Annick Boivineau e S. Goldstein.

Assinale-se o interesse da França na retomada de cooperação nuclear com o Brasil, demonstrado pela visita ao nosso País de delegação francesa chefiada pelo senhor André Giraud, Alto Comissário para Energia Atômica daquele país. Participei dessa missão a convite do governo brasileiro, na qualidade de líder de grupo de pesquisas do Centro de Estudos Nucleares de Grenoble, onde trabalhei de 1965 a 1972. A delegação objetivava negociar não só trabalhos futuros com o Grupo do Tório, como também a utilização da energia elétrica, que seria disponibilizada pela efetivação do projeto Itaipu, para enriquecimento de urânio, pela tecnologia da difusão gasosa, que seria fornecida pela França (Nota 7). Recordação dessa visita é registrada na fotografia abaixo (Figura 2).

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Figura 2 – Visita André Giraud ao Projeto Tório.

Recordo também, com prazer e gratidão, o papel desempenhado pelo Diretor do Centro de Estudos Nucleares de Grenoble, senhor Pierre Balligand, constante da Figura 3.

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Figura 3 - Pierre Balligand, Diretor do Centro de Estudos Nucleares de Grenoble

Suas relações com o Brasil iniciaram-se através da Agência Internacional de Energia Atômica, de que foi Diretor Geral Adjunto, e que se estenderam para além de Grenoble, onde ocupou também o cargo de Comissário para a Diversificação Técnico-científica do Comissariado de Energia Atômica.

Foram ainda consultores do grupo mineiro os professores Borisas Cimbleris (engenharia térmica) e J. Z. F. Diniz (engenharia estrutural). No âmbito do projeto foram instaladas uma Unidade Subcrítica (Capitu) e outras destinadas ao estudo do comportamento térmico dos combustíveis e componentes a serem eventualmente desenvolvidos. Foram também formulados programas computacionais para os cálculos exigidos pelas opções técnicas anteriormente apontadas.

Ressalte-se que, não sendo o tório um elemento físsil (a não ser por nêutrons de alta energia), mas sim fértil, isto é, transmutável em urânio 233 por captura de nêutrons térmicos (seguido de decaimento beta), tornava-se claro que o sucesso dos projetos com o tório exigiria, para a execução das três alternativas escolhidas, a existência prévia de reator alimentado a urânio natural ou a urânio enriquecido, de potência  conveniente, estimada como vimos em 30MW. No caso do plutônio, elemento trans-urânico, seria necessário efetivar sua separação do urânio irradiado, ou utilizá-lo diretamente, in situ, após sua geração pelo bombardeio neutrônico do urânio de massa 238.

As dificuldades decorrentes da necessidade do aporte de consideráveis investimentos, tanto financeiros como em equipamentos e na capacitação técnica, para implementar as etapas acima referidas, e sem o indispensável apoio do governo federal, levaram ao abandono do projeto. Ele chegou a envolver a participação ativa de 20 jovens engenheiros do IPR, listados na Nota 8.

Esta abordagem não interessou aos principais países líderes na geração de energia nuclear, a não ser a Índia que, desprovida de reservas de urânio, vem sustentando no último meio século linha de pesquisa sobre o ciclo do tório combustível. Como é bem sabido, sucesso nesta linha implica na disponibilidade de urânio enriquecido até há pouco inacessível a esse país. A assinatura recente do acordo indo-americano permite à índia superar tal obstáculo que enfrenta desde 1951, tendo agora tomado a decisão de construir um reator realimentador a ciclo de tório e moderação a água pesada, esse projetando esse país à construção de um grande número de reatores ditos rápidos para produzir tanto eletricidade quanto gerar urânio 233 (ref 21).

A China, por sua vez, elegeu entre os seus dez mais importantes projetos de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, lançar um programa para um reator de sal fundido no ciclo do tório. Segundo estudos realizados pelo Oak Ridge National Laboratory (ref 21), este tipo de reatores deverá produzir energia a baixo custo com segurança, eficiência e sustentabilidade. Conforme o relatado no site acima referido, o projeto de pesquisa e desenvolvimento chinês seria menos complexo e logo, possivelmente, mais barato do que a tecnologia adotada na Índia. (ref 22). Comparação recente dos ciclos de tório e urânio foi realizada recentemente para o Departamento Inglês de Energia e Mudança Climática (ref 23) Estes fatos deveriam induzir o governo brasileiro retomar os trabalhos iniciados nos anos 60 pelo Instituto de Pesquisas Radioativas com o objetivo de, pelo menos, acompanhar os pontos mais salientes das iniciativas mencionadas e levando naturalmente em conta que o nosso país é detentor da 6ª. reserva do mundo, segundo levantamento da "World Nuclear Association”, segundo mostra a Tabela 9 (Reservas mundiais asseguradas de tório).

Merece assinalar que vários engenheiros e pesquisadores que antes disso se desligaram do IPR quando de sua transferência para a CNEN, viriam contribuir significativamente para promover ou consolidar seis cursos de pós-graduação implantados na UFMG. Além disso, vários dos egressos do IPR exerceram funções de destaque em diversos programas importantes das administrações federal e estadual (Nota 9), como o programa de Qualidade Industrial e o do álcool motor.

Formaram-se nesses cursos, até 2006, 1.043 mestres e 399 doutores, somente nos setores de Química, Física e Ciências e Técnicas Nucleares. Experiências análogas devem ter ocorrido em outras instituições, ilustrando o importante papel catalisador das tecnologias de ponta na formação de recursos humanos de alto nível.

A evolução da produção técnico científica dos próprios Institutos pode ser apreciada nos gráficos I, II e III para o IPR; IV para o CDTN; V e VI para o IPEN; VII, VIII e IX para os Institutos da CNEN. No gráfico III estão apresentados pulsos no crescimento cumulativo dos trabalhos publicados, obtidos pela derivada de sua curva de crescimento.

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Gráfico I - Número Cumulativo de Trabalhos Publicados pelo IPR (1953 - 1972).

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Gráfico II - Tratamento logístico da evolução da produção técnico-científica do IPR entre 1953 e 1972

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Gráfico III - Análise de pulso do tratamento logístico da evolução da produção técnico-científica do IPR entre 1953 e 1972.

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Gráfico IV - Número cumulativo de trabalhos publicados pelo CDTN (1973-2005).

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Gráfico V - Número cumulativo de trabalhos publicados pelo IPEN (1958 - 2005).

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Gráfico VI - Tratamento logístico da evolução da produção técnico-científica do IPEN entre 1958 e 2005

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Gráfico VII – Número cumulativo de trabalhos publicados pelo IEN/CNEN,1958 – 2005

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Gráfico VIII - Tratamento logístico da evolução da produção técnico-científica da IEN/CNEN 1958 – 2005

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Gráfico IX - Tratamento logístico da evolução da produção técnico-científica do IEN/CNEN 1958 - 1979

Eles indicam claramente máximos de produtividade em 1960, 1964 e 1970, seguidos de notáveis decréscimos, correspondentes respectiva-mente à concentração de esforços na montagem e inauguração do reator Triga, ocorrida em novembro de 1960, e ao efeito negativo do golpe militar de 1964, comprovado pela dramática queda da produtividade científica ocorrida logo após esse evento. Nota-se também o efeito da transferência do IPR para a CBTN (CNEN), bem como o fim do Grupo do Tório, ocorrido posteriormente. Todos esses gráficos foram obtidos aplicando-se a modelagem desenvolvida por Marchetti e frequentemente utilizada em vários trabalhos do presente autor (ref 24).

É oportuno recordar que a experiência ganha pelo Grupo do Tório seria aproveitada, mais tarde, pelo projeto de construção de elementos combustíveis experimentais a tório e a urânio, em cooperação com técnicos alemães, no âmbito do acordo com a antiga República Federal da Alemanha.

Registre-se também que em 1966 o presidente general, H. Castelo Branco, utilizando o decreto-lei 200, subordinou a CNEN ao Ministério das Minas e Energia, retirando-o da Presidência da República e consequentemente reduzindo seu status político. Recordo ter prontamente protestado contra esta medida, em telegrama ao Presidente da República.

Em consequência dessa nova vinculação, criou-se no Ministério de Minas e Energia um grupo de trabalho constituído pela CNEN, Eletrobrás e Furnas que recomendou a construção de um reator de 500MWe. Essa recomendação foi adotada pela Nova Política Nacional de Energia Nuclear da administração Costa e Silva. A despeito do tratamento dado pelo governo ao Grupo do Tório, decidiu-se, ao implementá-la, pelo aproveitamento do pessoal técnico existente em todos os níveis, inclusive dos cientistas brasileiros de valor que se encontrassem no exterior. Para tal fim, o embaixador Sérgio Corrêa da Costa foi encarregado de manter contato com os cientistas então “exilados”.

7. O acordo com os Estados Unidos e a construção de Angra I. Criação da CBTN e da Nuclebrás. Acordo com a Alemanha.

Os primeiros contatos com a Alemanha foram propiciados pela visita do Chanceler Willy Brandt ao Brasil, ocasião em que se acertou entre os dois países a execução de um programa de cooperação cientifica e tecnológica.

Tais entendimentos, bem como as medidas então projetadas, frustraram-se com o fim do governo Costa e Silva. Em vez da participação da comunidade científica, inclusive daqueles que se encontravam no exterior, aplicaram-se novas e violentas medidas de repressão, tendo o setor passado, de 1970 a 1974, por profundas modificações. Criou-se a Companhia Brasileira de Tecnologia Nuclear (CBTN), subordinada à CNEN, nova empresa que tinha por objetivo ocupar-se das diversas fases de implementação das diretrizes da nova política. Todos os institutos, com exceção do IPEN, autarquia da USP, foram absorvidos pela CBTN, por decreto da época, tendo mesmo o IPR adquirido mais tarde nova denominação (Nota 10).

Procedeu-se também à revisão do Acordo de Cooperação com os Estados Unidos, a 17 de julho de 1972, o novo instrumento diplomático referindo-se então especificamente aos “Usos Civis da Energia Atômica”.

A CBTN naturalmente alterou os programas de pesquisa dos institutos; o Grupo do Tório, como vimos, foi extinto, ao passo que, contraditoriamente, ela resolveu aprofundar estudos sobre as possibilidades de participação da indústria nacional na construção da central nuclear de 500 MWe, sugerida pela administração anterior. Especificações para tal fim foram distribuídas, com vistas à construção da usina a ser localizada em Angra dos Reis. Abriu-se ao mesmo tempo processo de licitação internacional, do qual saíram vitoriosas a Empresa Brasileira de Engenharia, para a montagem dos equipamentos; as firmas Gibbs & Hill (EUA) e a Promon Engenharia (Brasil), para a elaboração do projeto. As obras civis foram entregues por concorrência à construtora Norberto Odebrecht.

Essa central, de 625 MW, seria alimentada por urânio enriquecido, o que – admitia-se então - tornaria impossível alcançar-se, em futuro previsível, a autonomia do País na implantação do ciclo de combustível; o Brasil passaria a depender do fornecimento de combustível estrangeiro, tornando-se neste passo, vulnerável.

Tornou-se claro que a política adotada contrariava frontalmente toda a postura de implantação do ciclo de combustível independente, estabelecido nos idos de 1946.

A decisão governamental que anunciava ser a instalação da Central de Angra instrumento fundamental para a transferência de tecnologia frustrou-se também. A participação nacional limitou-se apenas a 6% do custo final da usina, embora sua instalação tenha permitido considerável aquisição de experiência por nossos técnicos, principalmente no que concerne à segurança da operação. Tal decisão teve, lamentavelmente, o efeito de isolar e de desestimular o considerável potencial humano, gerado ao longo de vários anos, nos diversos institutos de pesquisa e em nossas universidades.

As limitações reveladas na implantação de Angra I, devido primeiramente à natureza duvidosa do próprio projeto, a técnica demonstrada em centrais similares, instaladas na ocasião em outros países; a inexperiência de gestão do setor, bem como outros fatores assinalados na referência (16), levaram a grande atraso na implantação da usina, que somente seria operada em 1983.

O fim da administração Médici coincidiu com o primeiro choque do petróleo - cujo barril saltou de US$ 3,88 para US$12,55 - e com a grande expansão da demanda de eletricidade.

A gravidade da crise energética que então se desenvolveu (a potência então instalada limitando-se a 17,4 GW) levou a nova administração à adoção de várias medidas, voltadas não só para a redução de nossa dependência energética externa - principalmente do petróleo - mas também ao aproveitamento de fontes alternativas nacionais, particularmente da hidroeletricidade e ao uso da biomassa (início do Programa do Álcool).

Foram então lançados, de 1975 a 1983, vários projetos: Tucuruí, Foz de Areia, Salto Osório, Salto Santiago e São Félix, além da usina a carvão de Candiota, totalizando cerca de 9 GW, aos quais deve acrescentar-se, pela sua singularidade, a usina binacional de Itaipu, com potência instalada de 12,6 MW. Essas medidas mais do que dobraram o potencial instalado, deixado pela administração anterior.

A situação energética em 1975 caracterizava-se, de fato, por um continuado aumento de consumo de energia elétrica, que atingiu 10,2% e 18,2% ao ano, respectivamente, nos dois anos subsequentes. A capacidade geradora instalada saltou de 19,5 GW, em 1975, para 21GW, em 1976.

Foi certamente a expectativa de manutenção dessa acelera-díssima taxa de crescimento da demanda de eletricidade, bem como nossa enorme dependência energética externa, que levaram o governo à assinatura do acordo com a República Federal da Alemanha. De fato a dependência energética do nosso País pode ser avaliada pela importação, em 1977, de 300 milhões de barris de petróleo, para alcançar, segundo as projeções então realizadas, 313 milhões já em 1978, face a produção nacional de tão somente 61 milhões de barris por ano.

As projeções da demanda de energia elétrica então vigentes estimavam que se deveria alcançar 50 GW nucleares no ano 2005. Esse objetivo, caso tivesse sido alcançado, elevaria a participação da energia nuclear no sistema elétrico a cerca de 71%, praticamente igualando a situação do Brasil à atual participação nuclear no sistema de geração francesa, que é a mais importante do mundo!

A cooperação com a Alemanha iniciou-se pelo protocolo de Brasília, assinado em 3 de outubro de 1974, início da cooperação que se formalizou no acordo de Bonn, o qual regeria as relações entre os dois países, no campo dos usos pacíficos da energia atômica. O acordo viria cobrir todas as fases do desenvolvimento da tecnologia nuclear, desde a mineração até à construção das centrais nucleares, de 1,35 GW de potência unitária. Surpreendentemente, a estrutura organizacional adotada pela NUCLEBRÁS, a 16 de dezembro de 1974, antecedendo a assinatura do acordo entre os dois governos, foi montada de modo a satisfazer, em detalhe, às numerosas empresas alemãs que participariam da implementa-ção do programa.

As diversas empresas, então estruturadas, tinham composição de capital variável. Assim, fundaram-se a NUCLAM, para exploração mineral, com a participação de 51% de capital nacional; a NUCLEN, para projetos e serviços de engenharia, com a participação nacional de 75%; a NUCLEP, para a execução de projeto de desenvolvimento, fabricação e comercialização de componentes pesados, com a participação nacional de 98,2%; a NUCLEI, para a produção de urânio enriquecido, com a participação nacional de 75%.

No último caso, tendo sido impedida a transferência da tecnologia de enriquecimento do urânio ao Brasil, por intervenção da Inglaterra, sócia da Alemanha e da Holanda na firma produtora desse material - a URENCO - optou-se pelo desenvolvimento de uma nova tecnologia, denominada “dos jatos centrífugos”, ainda muito incipiente. Juntaram-se à NUCON as várias empresas encarregadas de setores específicos, com a tarefa de construção das centrais que estivera, até então reservada à empresa Furnas Centrais Elétricas, subsidiária da ELETROBRÁS.

A NUCON viria a ser desativada pelo Decreto no 90.398, de 7 de novembro de 1984, em virtude de conflitos surgidos entre o setor elétrico tradicional e a NUCLEBRÁS.

A estrutura organizacional extremamente complexa da NUCLEBRÁS teve por objetivo, conforme os responsáveis da época, a necessidade de garantir a responsabilidade técnica e a efetiva transferência de tecnologia do parceiro alemão, em cada fase do Programa. Segundo rezava este, a associação empresarial também viabilizaria o aporte crescente de capital estrangeiro, na medida das necessidades de ampliação das atividades da holding NUCLEBRÁS.

O protocolo de Brasília gerou a expectativa, e mesmo a certeza, por parte das autoridades brasileiras, da execução plena desse programa extremamente ambicioso, calcado que fora em hipóteses de crescimento da demanda nacional de energia elétrica de tal monta a exigir a implantação de, no mínimo, 9 centrais nucleares de 1,35GW  até 1990.

De fato, mesmo antes de firmado o Acordo com a RFA a Presidência da República já aprovara, a 3 de junho de 1974, Exposição de Motivos No300, do Ministro da Minas e Energia, autorizando a construção de uma segunda unidade geradora na Central Nuclear  “Almirante Álvaro Alberto”, à qual seguiu-se decreto de 13 de junho de 1975, determinando a construção de uma terceira central também de 1,35 GW (Angra III).

Quanto à expectativa dos prazos de construção, contava-se com o término da Usina Angra II em 5,5 anos, em desacordo com a experiência internacional acumulada por países mais desenvolvidos do que o nosso, cujos prazos referidos raramente se reduzem a menos de 8 ou 10 anos. Como é sabido, Angra II só foi inaugurada em 2000, 23 anos após o seu início, em 1977!

A avaliação do Programa Nuclear Brasileiro, a contar de seu início, até 1986, foi realizada por comissão presidencial criada pelo decreto 91.606 de 2 de setembro de 1985. Ela foi presidida pelo autor e sua composição está descrita na Nota 11.

Verificou-se que, contrariamente às previsões existentes à época das decisões sobre as construções das centrais Angra II e Angra III, vários fatores vieram impedir a observância do cronograma de implantação, originalmente estabelecido.

Em primeiro lugar, as taxas de crescimento, tanto do PIB quanto da demanda energética, foram paulatinamente se reduzindo, sob o impacto da grave crise no balanço de pagamentos do Brasil, em decorrência dos grandes distúrbios na economia internacional, acentuados pelo segundo choque dos preços do petróleo, ocorrido em 1979. Essa crise perdurou praticamente nos 20 anos seguintes, levando a crescimento quase nulo da economia brasileira.

Vale lembrar que, paralelamente ao Programa Nuclear, iniciaram-se também, a partir de 1974, grandes obras, tanto no setor energético quanto fora dele (Itaipu e Tucuruí, já referidos; Ferrovia do Aço, Açominas, Estrada Transamazônica, etc.), que competiam com o setor nuclear pelo uso de recursos cada vez mais escassos, tanto internos quanto principalmente externos. Esses projetos, financiados com juros externos exorbitantes, contribuíram para aumentar dramaticamente a dívida externa brasileira, problema com que vinha se defrontando, até recentemente o País. Eis porque, em 2005, o crescimento do PIB brasileiro foi o segundo pior de toda a América Latina, superando apenas o do Haiti.

Além desses importantíssimos fatores, os problemas surgidos com as fundações de Angra II, decorrentes da sua localização, geologicamente problemática, provocaram inicialmente atrasos, na época da avaliação do programa, de 3,5 anos no cronograma de obras. Ela, de fato, recordou-se há pouco, somente foi inaugurada em fevereiro de 2000.

Cabe notar também que problemas semelhantes aos já ocorridos em outros países, sem que a experiência adquirida no exterior tenha sido aqui aproveitada, resultaram de divergências na interpretação de normas técnicas aplicáveis às fundações da Central. A própria localização do canteiro de obras, como já assinalado, gerou toda sorte de dificuldades gerenciais, notadamente no relacionamen-to, de um lado entre Furnas e a empreiteira das construções civis, e de outro entre Furnas, NUCLEBRÁS e CNEN. Esta última, como sabemos, era legalmente responsável pela segurança da central e, portanto, pelo licenciamento de sua construção, obedecendo para tanto a normas americanas, estranhas ao projeto, que fora inteiramente concebido segundo normas alemãs de filosofia básica, muito mais empírica e flexível do que aquela defendida pela CNEN.

Quanto a Angra III, como é de conhecimento geral, apesar da aquisição já efetuada de 45% dos equipamentos e de compromissos assumidos sobre 35% dos equipamentos restantes, correspondendo a US$ 750 milhões, estimava-se, em 1986, que o seu custo total atingiria cerca de US$ 2,8 bilhões incluídos os custos financeiros. A falta de decisão sobre a conclusão dessa usina gera, em consequência, gastos de cerca de US$ 20 milhões anuais (excluídos custos financeiros) somente para manutenção e conservação dos equipamentos, que se encontram estocados. Estima-se que, se a decisão de construir Angra fosse tomada hoje, a obra estaria concluída em seis anos, ou seja, em 2012. Para tanto, seria necessário um aporte adicional de US$1,8 bilhão.

A interrupção de facto do programa tornou quase ociosas, por exemplo, instalações do porte da NUCLEP, a não ser pelo atendimento de certas encomendas estranhas a sua missão. Destino semelhante teve a Usina de Reprocessamento da NUCLEBRÁS, cujo custo de construção atingiria, a partir de 1986, cerca de US$ 240 milhões. Permanece em operação parcial a fábrica de elementos combustíveis, iniciada em 1977 em Rezende. O projeto originalmente concebido envolvia três etapas - a montagem do elemento combustível, a reconversão do hexa-fluoreto de urânio em bióxido de urânio (UO2) e a fabricação de pastilhas contendo urânio enriquecido. Nela, foi montada toda a primeira recarga de Angra I, bem como algumas das cargas subsequentes dessa central e de Angra II. A partir de uma usina piloto do IPEN para a conversão do UF6 em UO2, implantou-se em Aramar, em maior escala, parte de projeto do chamado Programa Paralelo.

A despeito dos diversos óbices apontados na implantação do programa, vários importantes projetos de pesquisa e desenvolvimento foram realizados, tanto no IPEN quanto no CDTN. Assim, foram executados trabalhos sobre a conversão, já mencionados, e do enriquecimento isotópico, pelo método dos jatos centrífugos, no CDTN. Os dois institutos (CDTN e IPEN) ocuparam-se também com projetos de construção de reatores de pesquisa. O primeiro envolveu-se com a produção de zircônio (isento de háfnio), componente importante para o encamisamento dos elementos combustíveis. Na área da engenharia e gerência de projetos, desenvolveu considerável competência a NUCLEN.

Vale, ainda recordar que vários outros projetos, particularmen-te no desenvolvimento de protótipos de combustíveis a tório e urânio, e a tório e plutônio (em que o óxido de plutônio era substituído pelo óxido de cério, seu isomorfo, no desenvolvimento experimental de combustível modelo) foram desenvolvidos pelo CDTN, em cooperação com diversos grupos alemães. O primeiro elemento (tório-urânio enriquecido) foi desenhado tanto para Angra I quanto para Angra II e submetido a testes na Alemanha. (Convém lembrar que, face à recusa americana de fornecimento de carga para Angra I, o parceiro alemão, utilizando-se do urânio enriquecido da URENCO, construía os elementos combustíveis, alimentadores tanto de Angra I quanto de Angra II. O carregamento destes dois reatores continua dependente do urânio enriquecido da mesma origem, embora tenha se tornado viável construí-los na Fábrica de Rezende.)

O comportamento do novo elemento contendo tório não teve sua utilização efetivada em nossos reatores, devido à objeção essencialmente política, por parte de Furnas Centrais Elétricas, responsável pela gestão dos reatores.

Conforme relato de Ricardo Pinheiro, a documentação dessas experiências, realizadas com sucesso através da cooperação teuto-brasileira, encontra-se dispersa. Urge consolidar essa documentação a fim de retomar as experiências, principalmente as destinadas à promoção do uso do tório e consequente aumento de nossas reservas energéticas. No mesmo passo, tais providências alargariam nossas possibilidades de cooperação internacional sobre o uso do tório com países como a Índia, possuidores de importantes reservas deste elemento. Segundo anúncio recente, a Índia decidiu construir um reator breeder a Tório pioneiro.

Note-se também que a cooperação com a Alemanha permitiu a grande número de firmas brasileiras a aquisição de tecnologia necessária na construção da central Angra II, com a qualidade indispensável a tal empreendimento. Tal fato  foi notado no relatório da Comissão de Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro de 1986. A continuação da transferência de tecnologia para o setor industrial, bem como em outras áreas, após 1986, foram descritas pelo Dr. Witold Lepecki.

Vários projetos foram também elaborados sobre a fusão nuclear, ao longo dos últimos anos, sob o patrocínio da CNEN, nas universidades de Campinas, Federal Fluminense, São Paulo, Rio Grande do Sul, Brasília e no Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE), no Centro Técnico da Aeronáutica (CTA), no Instituto Militar de Engenharia (IME), no Instituto Engenharia Nuclear (IEN) e no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN). Trata-se de atividades que, embora ainda incipientes, foram retomadas principalmente pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, sob a liderança de Ricardo Galvão, face ao novo interesse no desenvolvimento dessa tecnologia, em projeto de demonstração via cooperação internacional em Cadarache, França.

No que respeita à formação de pessoal, consideráveis esforços foram realizados no âmbito do programa Pró-Nuclear, ao qual foram destinados US$ 66 milhões em 1973. O pessoal envolvido diretamente no programa, em 1986, atingiu 8.669 funcionários, dos quais 3.054 de nível superior, sendo 509 com mestrado e 167 com doutorado. Apesar da interrupção da construção de centrais, como já se assinalou, os institutos de pesquisa continuam desempenhando importante papel no desenvolvimento das aplicações de radio isótopos, na medicina nuclear, na agricultura e na engenharia de materiais. Recorde-se, a propósito, que os seis cursos de pós-graduação da UFMG, criados a partir dos anos 70, geraram um grande número de mestres e doutores. A título de exemplo, o número de titulados, somente em Química, Física, Ciências e Técnicas nucleares, alcançou 399 doutores e 1043 mestres, até o ano 2006.

O esforço realizado nos três institutos principais da área nuclear, incluindo-se o Instituto de Radioproteção e Dosimetria, pode ser avaliado pela respectiva produção científica, mostrada anteriormente nos Gráficos de I a IX.

8. O Programa Nuclear Paralelo 

Como já se assinalou, o ciclo do combustível constitui, por assim dizer, a alma de qualquer programa nuclear independente. A promessa da completa transferência de tecnologia nessa área, que seria propiciada pelo acordo nuclear com a República Federal da Alemanha, frustrou-se à vista da impossibilidade de transferir para o Brasil (ou de desenvolver conjuntamente com o nosso País) a técnica do enriquecimento do urânio por ultra-centrifugação. É claro que a utilização do urânio enriquecido como combustível, para alimentar não só os reatores Angra I e Angra II, mas também todos os 9 reatores que seriam implantados no quadro do programa de cooperação teuto-brasileira, exigia de nossa parte o esforço de desenvolvimento próprio dessa tecnologia de ponta. Além disso, a tecnologia dos jatos centrífugos que nos fora oferecida era não só ainda muito incipiente, à época do acordo, mas, segundo análises (teóricas) realizadas sobre essa técnica, indicavam-na como sendo excessivamente consumidora de energia e hoje muito cara. De outra parte, sua realização em escala piloto pelo CDTN nunca foi implementada por falta de recursos financeiros. Nessas circunstâncias, o IPEN, em estreita cooperação com engenheiros da Marinha Nacional, sob a liderança do Dr. Othon Pinheiro da Silva, iniciou a partir de 1978 o desenvolvimento da tecnologia de ultra-centrifugação, para permitir a produção de combustíveis alimentadores de um submarino a propulsão nuclear. Esse projeto de enriquecimento alcançou grande sucesso no plano tecnológico e encontra-se descrito em artigo contido no número 54 da revista Economia e Energia (ref 25). O êxito desse empreendimento constitui conquista maior da tecnologia brasileira, que permitirá, uma vez retomado o desenvolvimento de nosso programa nuclear, a almejada independência nacional, no que concerne ao ciclo de combustível.

O caráter estratégico vital do domínio do ciclo do combustível foi demonstrado pela recusa da administração Carter, em 1977, de fornecer o urânio enriquecido para alimentação de Angra I, reator fabricado pela empresa Westinghouse. Esse fato gerou crise somente superada pelo acordo com a Alemanha, que permitiu não só o fornecimento do urânio enriquecido pela Urenco como também desenvolver a fabricação dos elementos combustíveis para Angra I pela KWU. Esta tecnologia, bem como a utilizada na produção dos elementos combustíveis alimentadores de Angra II, foi transferida para a Fábrica Nacional de Combustíveis Nucleares de Resende.

A instalação recente de duas baterias de ultra-centrifugação naquela fábrica de elementos combustíveis, pelo Ministro de Ciência e Tecnologia, é auspiciosa, pois que talvez represente um primeiro passo na retomada das atividades do setor, que se encontram virtualmente interrompidas a despeito da inadiável necessidade de retomá-lo.

9. A Matriz Energética Nacional e a Complementação Térmica do Parque Hidroelétrico. 

O futuro provável da energia termonuclear no Brasil é analisado em documento recente do Plano Nacional de Energia 2030 (ref 26). Nele são consideradas diferentes alternativas, particularmente quanto à futura complementação térmica (nuclear ou não) da geração hidroelétrica, que representa hoje 285 TWh, ou seja, 10,7% do potencial tecnicamente aproveitável do País (dados de 2003).

O crescimento da oferta de energia alcançou, entre 1971 e 2002, a taxa média anual de 6,4%; a participação da energia nuclear na oferta interna de eletricidade era, em 2005, de apenas 9,5 TWh, equivalente a 2,2% do total.

Na oferta interna de eletricidade, em 2005 a hidroeletricidade foi responsável por 340,5 TWh, ou seja 77,1% do total; 8,3%,  também de origem hidroelétrica, eram importados, o restante sendo de origem térmica.

Comparem-se estes resultados com o consumo de 270TWh previsto pelo presente  autor através da modelagem descrita no número 45 da Revista Economia e Energia (ref 27). A previsão, realizada em 1988, encontra-se na figura 20 do trabalho listado na referência (ref 28).

A participação hidroelétrica na futura geração nacional de energia, que se supõe será muito maior do que a atual, deve ser examinada cuidadosamente, segundo trabalho intitulado Um Porto de Destino para o Sistema Elétrico Brasileiro” (ref 29).

Recorda-se aí que:

1º) o sistema brasileiro de geração de eletricidade caracteriza-se por sua dimensão continental e pela forte predominância da geração hídrica;

2º) a dimensão do País tem alimentado a expectativa de que diferenças sazonais entre as várias regiões sejam complementares,  garantindo a tranqüila expansão do sistema hidroelétrico;

3º) baseado em 70 anos de estatísticas pluviométricas, ele mostra ser possível uma modelagem matemática bastante simples e adequada para cada região separadamente, excetuada a região sul, de comportamento imprevisível;

4º) a hipótese de existir  uma reserva hídrica inesgotável, disponível a qualquer época, na região amazônica é altamente discutível, pois que apresenta o mais longo período seco das diversas regiões.

O estudo também focaliza a drástica redução do estoque de energia hídrica dos nossos reservatórios (barragens), que diminuiu de dois anos para, atualmente, cerca de seis meses.

Essa situação torna indispensável a crescente complementa-ção térmica da geração hidroelétrica do País.

Entre as opções existentes, a utilização dos combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) mostra-se cada vez mais inconveniente, em virtude da contribuição que dão ao efeito estufa. À parte a possibilidade de maior participação da energia derivada da biomassa, a contribuição dessa fonte apresenta problemas de competição pelo uso do solo e também, em certos casos, problemas sazonais, com exceção da cana-de-açúcar, cujo bagaço é utilizável para a geração de energia elétrica na entressafra.

A participação relativa das diferentes fontes de energia primária, descritas por Marchetti em 1985 e atualizada até o ano 2005 por Carlos Feu, consta do Gráfico X (ref 26) pode-se notar que, depois de um crescimento excessivamente rápido da energia nuclear, sua demanda deverá obedecer a ritmo mais lento nos próximos anos (alcançando 17% de participação em 2030).

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Gráfico X - Participação das Fontes Energéticas Primárias no Consumo Mundial: (a) até 1985 e (b) atualizado

O panorama do uso dessa energia acelerou-se a partir de 1965, arrefecendo, todavia, nos anos 1970, conforme ilustra o Gráfico XI.

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Gráfico XI – Energia Nuclear no Mundo: Parque Instalado de Geração Nuclear

A participação atual da energia nuclear na geração elétrica mundial é próxima de 15,5%; a previsão de Marchetti, limitando-a a 17% em 2030, revela que a participação futura dessa energia seria modesta, mesmo considerando-se o crescimento inercial expressivo desse insumo, naquela data. Quanto ao Brasil, tal participação alcançaria 5% naquele ano, correspondendo a 18,9 GW, conforme a Tabela I, retirada da referência (24).

Tabela I – Capacidade Instalada e Produção de Eletricidade para Centrais de Serviço Público

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Cabe concluir que em qualquer hipótese a hidroeletricidade continuará a ter uma participação largamente dominante na matriz energética nacional, à vista do potencial disponível, estimado em 265 GW, que se distribui regionalmente de maneira bastante regular, conforme mostra a Figura III. Nela estão apresentados também os dois ritmos de crescimento previstos para 2030, segundo hipóteses de obter-se PIBS de 3,8% ao ano (alto) e 3,0% ao ano (baixo), respectivamente neste período. O crescimento anual do potencial instalado seria então de 4,2% e de 3,1%.

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Figura II – A Hidroeletricidade no Brasil e seu crescimento planejado (Plano 2030).

Ao terminar, desejo ressaltar a fundamental importância de dois problemas até agora não resolvidos que afetam o setor nuclear como um todo.

O primeiro diz respeito à acelerada perda dos recursos humanos formados ao longo do programa, particularmente graças não só ao “Pró-Nuclear”, mas, posteriormente, aos egressos das universidades que dispõem de cursos envolvidos com o setor. O envelhecimento do pessoal técnico e a falta de trabalho decorrente da inexistência de qualquer atividade nuclear mais ampla configura um quadro de desperdício intolerável.

Vale também recordar que até 1986, a Comissão de Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro verificou que foram investidos US$ 4,200 bilhões no setor, excluídos os custos financeiros, os quais deveriam atingir somente para as centrais nucleares, mais de US$ 1,800 milhões, se acaso fossem obedecidos os cronogramas de implantação dessas usinas. Encontra-se na Nota 12 uma reprodução dos Quadros I, II e III, retirados do referido relatório (ref 17). Sem comentários.

Saliente-se ainda a importantíssima questão da segurança nuclear, afetada pelo fato de que o órgão que licencia e fiscaliza todas as atividades – a CNEN – envolve-se também, contraditoriamente, com a execução de trabalhos correntes, não só nos seus próprios laboratórios e indústrias vinculadas, mas também em todas aquelas que utilizam radiações nucleares pelo país afora. Esta perigosa prática, que vem sendo denunciada ao longo dos anos, particularmente pela Comissão de Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro, não recebeu até hoje a atenção que se impõe. Assim, o acidente ocorrido em Goiânia continua esquecido, da mesma maneira que o alargamento e manutenção da estrada Rio - São Paulo, indispensável para garantir a evacuação da população de Angra dos Reis, na eventualidade de acidente, que não pode ser descartado de modo absoluto, nas centrais nucleares localizadas naquela região.  Sobre esse assunto o autor deste trabalho, na qualidade de Presidente em exercício da Academia Brasileira de Ciências, alertou o Presidente da República, em maio de 1992, para a necessidade de exame dessa questão, quando se noticiava a reestruturação que o Governo Federal planejava realizar no setor nuclear (Anexo 2). Na primeira Administração Fernando Henrique Cardoso, o autor, abordado em visita as centrais de Angra dos Reis, pelo então deputado Marcondes Perillo, atual governador de Goiás, sugeriu para a solução desse grave problema a adoção de legislação semelhante aquela atualmente vigente na Espanha. Ao que tudo indica, o projeto de lei apresentado pelo atual governador de Goiás, não prosperou.

Finalmente a retomada das atividades do Programa Nuclear, pela finalização da construção de Angra III, torna-se cada vez mais urgente face às incertezas criadas pelas alterações imprevisíveis tanto do custo quanto da disponibilidade dos combustíveis fósseis, cuja participação se anuncia importante para a complementação térmica de nosso parque hidroelétrico.

Vale destacar também a importância da retomada dos trabalhos sobre o aproveitamento do tório para a produção de energia nuclear em nosso País. Como é bem sabido, a tecnologia de produção do oxido de tório, a partir das areias monazíticas, é plenamente dominada no Brasil desde os anos 50.

As contribuições dos doutores Ricardo Pinheiro, Witold Lepecki e Sérgio Filgueiras certamente trarão informações mais amplas sobre o assunto que volta a interessar a opinião pública brasileira.

Um resumo do presente trabalho foi apresentado oralmente na sessão inicial do Simpósio Francisco Magalhães Gomes, promovido pelo Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear, em 21 de agosto de 2006. Embora longo, ele apenas condensa alguns episódios da acidentada história da energia nuclear entre nós.

10. Agradecimentos

Este trabalho foi realizado mediante inestimável acesso a informações da CNEN e do CDTN, através dos Drs. Ailton Fernando Dias e Sérgio Almeida Cunha Filgueiras. Agradeço ao professor Ricardo Brant Pinheiro as informações sobre certos aspectos das atividades do grupo do Tório e aos professores Márcio Quintão Moreno e Omar Campos Ferreira pela leitura atenta e frequente correção do texto; o último pela co-produção do Gráfico III. Ao doutor Carlos Feu Alvim e à equipe de Economia e Energia agradeço por suas valiosas sugestões e frequentes discussões do assunto. Muitos dados utilizados provêm do Relatório de Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro 1986 (referência 16). As informações bibliográficas sobre a produção científica do CDTN foram coligidas gentilmente pela sua bibliotecária, Senhora Lenira Santos, a quem sou muito reconhecido. Sou grato ao professor José Domingos Fabris pelas informações relativas à produção científica realizada no Departamento de Química do ICEX da UFMG bem como no departamento de pesquisas fundamentais do Centro de Estudos Nucleares de Grenoble, França. Agradeço também ao engenheiro Mateus Vargas Garzon a elaboração dos Gráficos I, II, IV, V, VI, VII, VIII e IX.  Meus agradecimentos, por fim, a Patrícia Bastos Leão pela sua competência e paciência, que foram inestimáveis na redação deste trabalho.

11  - Referências

(1) Henri Becquerel, Académie des Sciences, 24 Fev; 3,9,30 Mars et 18 Mai, (1896).

(2) H. Hertz, Ann. d. Phys., 31, 983 (1887); ver também A. l. Hughes e l. A. Du Bridge, Photoelectric Phenomena, McGraw Hill, New York, (1932).

(3) Goldschmidt, B., Atomic Rivals, Rutgers University Press, New Brunswick and London, 1990.

(4) J. Costa Ribeiro em Fernando de Azevedo, As Ciências no Brasil, vol. I, cap. III, p. 163, Edições Melhoramento, São Paulo, (1955).

(5) Guimarães, Djalma, Anais da Academia Brasileira de Ciências. I, n.4,198-200 (1929).

(6) Othon H. Leonardos em Fernando de Azevedo, As Ciências no Brasil, vol I, cap VI, p.276, Edições Melhoramento, São Paulo, (1955). Ver também Luiz Cintra do Prado em “A Radioatividade nas Águas Hidrotermais Brasileiras”, Escolas Profissionais Salesianas, USP, (1938).

(7) Lattes, C. M. G., Muirhead, H., Occhialini, G. P. S. and Powell, C. F. Processes involving charged mesons. Nature, 159, 694 - 697, (1947).

(8) Atomic Energy for Military Purposes, Henry De Wolf Smyth. Acesso 16, jun, 2006.

http://www.atomicarchive.com/docs/Smith/Report.

(9) C. V. Dutra, Anais da Escola de Minas de Ouro Preto, 55 (3), 185 – 192, (2002).

(10) Vargas, J. I., Science in Brazil, Academia Brasileira de Ciências, Rio de Janeiro, (2000).  

(11) Machado, Ninon, Rev. Dir. Nucl, Rio de Janeiro 3 (2) ,(1981).

(12) A. Girotto, Rev. Dir. Nucl, Rio de Janeiro, 3 (2): 33 – 37, (1981).

(13) Forman, John M. A., Rev. Dir. Nucl, Rio de Janeiro, 3 (2): (1981)

(14) Cordani, U. G., Iyer, S. S., Taylor, P. N., Kawashita, K., Sato, K., MCreath, I. ?Pb-Pb,  Rb-Sr and K-Ar systematics of the Lagoa Real Uranium province (South-central Bahia, Brazil) and the Espinhaço cycle, Journal of South American Earth Sciences., v.5, p.33 - 46, 1992.

(15) Lattes, C.M.G., Fugimoto, Y. e Hasegawa, S., Phys. Report, Phys. Let, 65 (3), (1990).

(16) “Proceedings of a Study Group on the Utilization of Research Reactors”, São Paulo, 4-8 nov. (1963).

(17) Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro, Relatório ao Presidente da República, Brasília, 17, abr, (1986).

(18) Santos J.C., Brito S.S.  (CNEN), Mello J.C, and Urban C.W.,  (IPR), “Thorium-cycle possibilities in the Brazilian nuclear programme”,  in “Utilization of Thorium Power Reactors”, IAEA, (Technical Reports Series No52). Viena, (1966).

(19) “The INSTINTO Project – A status and progress report on the Thorium reactor development program”,  “Staff Report”, Thorium Group, in Summary report of the meeting “ Working Group on Thorium Utilization”, IAEA, Viena, 12-14 Dec, (1966).

(20) Brito, S. Salvio and Lepecki, W.P.S, “Preliminary assessment of heavy-water thorium reactors in the Brazilian Nuclear programme”, in Symposium on Heavy-Water Power Reactors, IAEA, Vienna, 11-15 set, (1967).  Proceedings, IAEA, Viena (1968).

(21) http:nucleargreen.blogspot.com.br/2011//08/indian-and-chinese-development.html, do dia 23.8.2011

(22) Summary of the Objectives, the Design, and a Program of Development of Molten -Salt Breeder Reactors, ORNL 851, June 1967

(23) Comparison of Thorium and Uranium Fuel Cycles NNL (11) 11.593, Issue 5, March 2012 (copyright National Nuclear Lab.Ltd.)

(24) Vargas J. I., The technological prospective: Prediction with a simple mathematical modeling, Economy & Energy, 45-46, (2004). 

(25) Pinheiro da Silva, Othon e Marques Ferreira, André Luiz, O Enriquecimento do Urânio no Brasil, Economia & Energia, 54, (2006)

(26) Geração Termonuclear, Plano Nacional de Energia 2030, Ministério de Minas e Energia, Brasília, 14 jun, (2006).

(27) Vargas J.I., A Prospectiva Tecnológica: previsão com um simples modelo matemático, Economia e Energia, 45, p. 24, 2005. e Gráfico V do presente trabalho, devido a Carlos Feu Alvim e J. I. Vargas.

(28) Vargas J. I., “The Brazilian Energy Scenario and the Environment: an Overview”, Ciência e Sociedade Séries, Ministério da Ciência e Tecnologia, Brasil, (1992) (CBPF -CS-003/92).

(29) Feu Alvim Carlos (coordenador), José Israel Vargas, Othon Luiz Pinheiro da Silva, Omar Campos Ferreira e Frida Eidelman; Um Porto de Destino para o Sistema Elétrico Brasileiro _ Características dos Sistemas Elétricos Integrados do Brasil e sua Projeção até o Horizonte de 2005_ Economia e Energia, 49, (2005).

 

12. Notas

Nota 1 (p. 12) – É surpreendente que já tivessem sido conhecidas as funções do lítio, elemento usado para a futura produção da bomba de hidrogênio; do chumbo 208 e do cádmio, elemento usado na barra de controle da potência dos reatores. É possível que a referência ao lítio prenda-se à sua utilização como alvo de prótons, produzidos num ciclotron como fonte de nêutrons 3.600 vezes mais intensa do que a da fonte de rádio-berilo, até então a única disponível para a determinação de k, o coeficiente de multiplicação da pilha de urânio-grafite, estudada por Fermi e Szilard.

Nota 2 (p. 14) - A Comissão era constituída por: Bernardino de Mattos, como presidente, e  Arthur Moses, Bernardo Geisel, Carlos Chagas Filho, Elisiário Távora, Ernani de Motta Rezende, Francisco Maffei, Joaquim Costa Ribeiro, José Leite Lopes, Luiz Cintra Prado, Marcello Damy de Souza Santos e Luiz Pilla.

Nota 3 (p. 21) -  A CNEN, desde sua criação há 47 anos até os dias atuais, esteve subordinada a várias instâncias administrativas. Até 1967, à Presidência da República; entre1967 e 1986, ao Ministério de Minas e Energia (Decreto no 60.900/67); de 1986 a 1999, à Presidência da República (Secretaria de Assessoramento da Defesa Nacional, SADEN/PR, Secretaria de Assuntos Estratégicos, SAE/PR e Ministério Extraordinário de Projetos Estratégicos, MEPE/PR, conforme os decretos no 93.337/86 e no 2.823/99 e Lei no 8.028/90); e finalmente, a partir de 1999, ao Ministério de Ciência e Tecnologia ( MP n 1.911/99). É claro que tão variada vinculação não deixa de refletir as grandes flutuações de nossa política nuclear.

Nota 4 (p. 24) - A Cooperação com a França intensificou-se com a visita do autor deste trabalho àquele país em 1961, a convite de Jean Debièsse, então diretor do Laboratório de Saclay,  vinculado ao Comissariado de Energia Atômica francês, que nos visitara naquele ano. A par de missões de dezenas de técnicos e cientistas brasileiros à França, seguiu-se a vinda de especialistas franceses em todas as áreas envolvidas com o projeto de construção de centrais nucleares, a serem alimentadas por urânio natural metálico como combustível, moderadas a grafite e refrigeradas a gás carbônico. Essa cooperação no domínio dos reatores de potência foi interrompida em 1964 e retomada, com muito menor intensidade, no âmbito do Projeto Tório, concebido no IPR, que durou até fins de 1973, quando o Brasil optou pela aquisição de um reator a água pressurizada e urânio enriquecido (PWR) dos Estados Unidos (Angra I). Ver também nota 8.

Nota 5 (p. 27) – A comissão encarregada da formulação do regime de salvaguardas, de que participava o Brasil, permaneceu bloqueada: a URSS manifestava-se contra o sistema de inspeção, que considerava ser mero instrumento de espionagem; a França abstinha-se, alegando prejuízos ao desenvolvimento de seu próprio programa; os países em desenvolvimento, como a Índia, o Brasil e o Irã, opunham-se aos referidos mecanismos por considerá-los discriminatórios e prejudiciais aos seus interesses. Recordo que, em consequência da explosão da série de bombas atômicas chinesa, tanto a França quanto a URSS vieram a aderir à maioria dos dispositivos do sistema de salvaguardas.  Superou-se, pois, a dificuldade criada à implantação do sistema de inspeções, ao mesmo tempo eximindo-se deles as potências do clube atômico. Esse privilégio beneficia tanto as pioneiras do sistema como, na prática, os países não signatários do Tratado de não Proliferação Nuclear (TNP), como a Índia, o Paquistão e Israel.

A Junta de Governadores da AIEA era constituída de três grupos de países: os membros do Clube Atômico, possuidores de armas nucleares; os países detentores de importantes reservas de minérios atômicos em seu próprio território ou em suas colônias; e os países mais adiantados de cada continente. O Brasil fazia parte do último grupo, devido a sua participação ativa e independente, bem como seu grau de desenvolvimento, desde os primórdios da era nuclear. Nosso País, entretanto, teve contestada pelos Estados Unidos sua condição de país mais avançado da região; o governo dos EUA propôs que nossa participação na AIEA fosse em rodízio com a Argentina. Para isso, a Junta de Governadores da AIEA designou um comitê de três membros, presidido pelo físico Gunnar Randers, para ouvir as delegações: a argentina, dirigida pelo Almirante Quihillalt, assistido por três especialistas, e a brasileira, chefiada pelo professor Marcelo Damy de Souza Santos, assessorado por F. B. Franco-Netto, Luiz Cintra do Prado e pelo presente autor. A comissão reuniu-se com os interessados em Paris, durante um mês, para formular recomendação conclusiva sobre a questão à Junta de Governadores. Como era fácil prever, a comissão técnica não chegou a qualquer resultado, devolvendo o assunto à Junta. Segundo o regimento da Agência, a decisão seria obtida através de votação. A avaliação dos votos sugeria provável vitória do Brasil, que, no entanto, foi impedida de efetivar-se pela renúncia à nossa candidatura, na última hora, por instrução do governo. Desde então o Brasil participa da Junta de Governadores em rodízio com a Argentina. (Board of Governors, International Atomic Energy Agency, GOV/INF/ 74, 2 Jul 1962.)

Nota 6 (p.28) – Os diversos acordos destinados ao controle da produção, uso e testes nucleares foram os seguintes:

 1°) Agosto de 1963: Tratado que proíbe testes com armas nucleares na atmosfera, no espaço exterior e nos oceanos.

 2°) Fevereiro de 1967: Tratado de Tlatelolco, que proíbe armas nucleares na América Latina e no Caribe, somente efetivado após várias peripécias, em 1994.

 3°) Julho de 1968: Tratado sobre a Não Proliferação de Armas nucleares (TNP), que proíbe os cinco detentores oficiais de armas nucleares de repassar material e tecnologia a outros países. Estes, por sua vez, se comprometem a não produzir bombas nucleares.

 4°) Fevereiro de 1971:  Proíbe testes de armas nucleares e armas de destruição em massa no fundo dos oceanos e nos subsolos.

 5°) Maio de 1972: Acordo entre Estados Unidos e União Soviética sobre limitação dos sistemas de mísseis anti-mísseis balísticos.

 6°) Junho de 1973: Acordo entre Estados Unidos e União Soviética sobre a prevenção da guerra nuclear.

 7°) Junho de 1979: Estados Unidos e União Soviética assinam acordo que limita o crescimento qualitativo e quantitativo de armas nucleares estratégicas.

 8°) Abril de 1995: O Conselho de Segurança da ONU garantes assistência às nações não-nucleares signatárias do TNP que sejam objeto de ameaça ou ataque nuclear.

 9°) Setembro de 1996: Tratado de proibição de testes nucleares, ao qual aderiram 155 países, recusaram-se a aderir a Índia, o Paquistão e a Coréia do Norte.

 10°) Maio de 2000: As cinco grandes potências nucleares  assinam  um   acordo  destinado a  realizar “esforço para eliminar totalmente seus arsenais nucleares”.

 11°) Dezembro de 2003: O Irã assina o “protocolo adicional” ao TNP; a Líbia anuncia ao mesmo tempo que renuncia ao desenvolvimento de armas de destruição em massa.

 12°) Fevereiro de 2004: A Coréia do Norte anuncia que possui bomba nuclear.

Nota 7 (p.35) – Em consequência dessa visita e de minha posição favorável ao desenvolvimento autônomo do ciclo de combustível no Brasil, utilizando o tório, segundo informação fidedigna, o Conselho de Segurança Nacional propôs e obteve um decreto secreto que proibiu a Comissão Nacional de Energia Nuclear de manter relações com o presente autor.

Nota 8 (p. 38) - Equipe do Grupo do Tório em dezembro de 1966: Wiltold Piotr Stefan Lepecki, Carlos Márcio Mascarenhas Dale, Sérgio de Salvo Brito, Jair Carlos Mello, Carlos Alberto Ferreira Lima, Fernando Antônio Nogueira Carneiro, José Mendonça de Lima, Ricardo Brant Pinheiro, Carlos Werth Urban, Walkírio Ronaldo Andrada Lavorato, Paulo de Carvalho Tófani, Paulo Márcio Furtado, João Luiz Campos, Juarez Távora Veado, Paulo M. Guedes, Serafim M. Lages, Guido Afonso Lages e Borisas Cimbleris. Em 1967, a equipe era constituída dos seguintes profissionais: Jair Carlos Mello, Ricardo Brant Pinheiro, Carlos Alberto Ferreira Lima, Fernando Antônio Nogueira Carneiro e José Mendonça de Lima, Carlos Márcio Mascarenhas Dale, Carlos Werth Urban e Walkírio Ronaldo Andrada Lavorato, Paulo Márcio Furtado e Paulo de Carvalho Tófani, João Luiz Campos, Juarez Távora Veado, Paulo M. Guedes, Serafim M. Lages, Guido Afonso Lages e Borisas Cimbleris. Participaram também, os estudantes de pós-graduação: M.S.B. Faria, L.F.B.M. Campos, M. E. L. Torres, G.P. Guimarães, Eustáquio Van Petten Machado e José Eduardo Morais Filho.

Nota 9 (p. 40) - Por pior que tenha sido a política então implantada pela CBTN, ao provocar a migração de muitos técnicos e cientistas para a Universidade, permitiu que eles liderassem a criação de 6 cursos de pós-graduação de alto nível em Metalurgia, Física, Ciência da Computação, Ciências e Técnicas Nucleares, Engenharia Térmica e Química. Um bom número de especialistas dessas áreas desempenharam importantes papéis no desenvolvimento dos setores de tecnologia industrial básica (qualidade industrial, sob a liderança do professor Juarez Távora Veado, originário da área de Metalurgia da Universidade Federal de Minas Gerais e do IPR), bem como na formulação de políticas públicas para a área do Meio Ambiente (criação da COPAM, Comissão de Política Ambiental do Estado de Minas Gerais). Também foi notável a participação dos engenheiros egressos do setor nuclear no desenvolvimento do Programa Nacional do Álcool; ironicamente, eles contribuíram, como membros da Fundação João Pinheiro, para a formulação de um programa de formação de pessoal para a área nuclear (o Pró Nuclear), atendendo a apelo do próprio Presidente Ernesto Geisel, realizado durante almoço ocorrido no Clube do Congresso Nacional, durante os trabalhos da Comissão de Inquérito do Senado Federal sobre o Programa Nuclear Brasileiro. Essa Comissão foi presidida pelo então senador Franco Montoro. O Pró Nuclear, gerido pelo CNPq, foi bastante bem sucedido e constituiu-se em importante auxílio ao atendimento da grande demanda de pessoal criada pelo futuro acordo nuclear com a Alemanha.

Nota 10 (p. 47) - Provavelmente o IPEN escapou dessa medida arbitrária não tanto por ser autarquia estadual, mas por já estar envolvido em outros projetos excluídos das imposições das regras de salvaguardas da AIEA, aplicadas à NUCLEBRÁS e logo ao CDTN e ao IE, que se tornaram partes integrantes dessa empresa. Isso permitiu ao IPEN, que permaneceu ligado à CNEN, estabelecer  cooperação com a Marinha Nacional, a partir de 1978, para o desenvolvimento da tecnologia de ultracentrifugação. Segundo o acordo com a Alemanha, o CDTN destinar-se-ia à absorção da tecnologia de enriquecimento prevista no acordo, que era, como se sabe, muito limitada. (Ver referência 16, onde é também relatada a iniciativa do Centro Técnico da Aeronáutica de obter o enriquecimento isotópico do urânio pelo uso de lasers).

Nota 11 (p. 52) - A Comissão de Avaliação do Programa Nuclear Brasileiro foi presidida pelo autor deste trabalho, ocupando a vice presidência o professor Oscar Sala. Compunham-na os senhores: Alberto Pereira de Castro (IPT), Caspar Erich Stemer (UFSC), Eduardo Penna Franca (UFRJ), Fernando Cláudio Zawislak (UFRGS), José Ephim Mindlin (Metal Leve), José Pelúcio Ferreira (FINEP), Luiz Renato Caldas (UFRJ), Paulo Francini (FIESP), Marcelo Damy de Souza Santos (IEA e USP), Ramayana Gazzinelli (UFMG), José Leite Lopes (CBPF e representando o MCT), José Guilherme Araújo Lameira Bittencourt (IBQN), Luiz Augusto de Castro Neves (Secretaria do CSN), Roberto Rodrigues Krause (MRE), José Wanderley Coelho Dias (Nuclebrás). Foram ainda convidados para acompanhar os trabalhos da comissão, como observadores, representantes da Secretaria do Planejamento da Presidência da República, do Ministério da Fazenda e do Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente.

A Comissão alertou, em sua recomendação número 4, que “À vista do adiantado estágio de avanço dos programas nacionais de aplicações pacíficas da energia nuclear no Brasil e na Argentina, que são largamente equivalentes, buscar intensificar a cooperação nuclear bilateral visando, inter alia, a promoção de empreendimentos conjuntos no campo dos usos pacíficos da energia nuclear, bem como o estabelecimento gradual de um mecanismo de inspeção mútua de tais atividades, nos dois países”.

NOTA 12 (p. 67) – Três quadros de consolidação de investimentos no ciclo de combustível nuclear e nas usinas nucleares, excluídos os Custos Financeiros. Fonte: CAPNB (1986)  

 

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Revised/Revisado:
Friday, 07 November 2014
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