Economia & Energia
Ano XIV-No 76
Janeiro
/Março de 2010
ISSN 1518-2932

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Zoneamento Ecológico-Econômico e Desenho de Uso Optimal dos Territórios de Bacias Hidrográficas

O Planejamento do Setor Elétrico Brasileiro e o Contexto Mundial de Mudanças Climáticas

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Grupo de Estudos do Setor Elétrico UFRJ

O Planejamento do Setor Elétrico Brasileiro e o

 Contexto Mundial de Mudanças Climáticas

 Nivalde José de Castro: nivalde@ufrj.br

Guilherme de A. Dantas: GuilhermeGuilherme@ppe.ufrj.br

Resumo

As fontes alternativas e renováveis para geração de e energia elétrica podem contribuir para uma matriz energética com baixa intensidade de carbono. Assim, deve-se garantir a inserção destas fontes na matriz energética brasileira em detrimento de combustíveis fósseis. Os autores propõem a realização de leilões específicos para cada uma destas fontes.

Abstract

Alternative and renewable sources for electric generation can contribute to na energy matrix with low carbon intensity.  Therefore, the insertion of these sources in the Brazilian energy matrix in detriment to fóssil fuels should be guaranteed. The authors propose specific auctions for each one of these sources.

Palavra-chave: Brasil, matriz energética, fontes renováveis, combustíveis fósseis.

1 - Introdução

A redução das emissões de gases do efeito estufa na atmosfera e, por conseguinte a limitação do aquecimento global é condição basilar para a garantia da sustentabilidade da vida na biosfera no médio e longo prazo. Trata-se de uma questão de ordem global, onde as responsabilidades são comuns, porém diferenciadas porque o aumento da concentração de gases do efeito estufa verificado a partir do advento da Revolução Industrial foi ocasionado essencialmente pelos países hoje mais desenvolvidos.

No entanto, e esta é uma questão que vem ganhando relevância, a responsabilidade deste conjunto de países no aumento do efeito estufa não exime o restante dos países da necessidade de se desenvolverem com base em alternativas tecnológicas sustentáveis em termos ambientais. Neste processo, deve-se considerar a adoção por estes países de estratégias leap frog de desenvolvimento. Esta trajetória de desenvolvimento seria distinta daquela percorrida pelos países do Norte, em termos ambientais e de consumo de energia. Esta diferenciação pode vir a se constituir em uma grande oportunidade econômica, especialmente para países que já possuem um significativo grau de desenvolvimento como o Brasil.

O setor energético, maior responsável pelo aumento da concentração de gases do efeito estufa a nível mundial, possui uma diminuta participação no total das emissões brasileiras devido à relevante participação de fontes renováveis de energia na matriz energética brasileira, com destaque para a energia hidroelétrica e o consumo de etanol pelo setor automobilístico. No entanto, o Brasil é um dos maiores emissores de gases do efeito estufa do mundo, emissões estas oriundas essencialmente do desmatamento. Neste sentido, em um contexto de resposta às mudanças climáticas o Brasil - pela sua crescente importância internacional e magnitude de suas emissões - precisa ter uma posição pró-ativa nas discussões relativas à mitigação do aquecimento global e, sobretudo, tomar atitudes e adotar estratégias que venham a reduzir suas emissões.

O argumento central deste artigo é o seguinte: embora o problema brasileiro relativo às emissões de gases do efeito estufa esteja relacionado à mudanças no uso da terra, o setor energético, especialmente o setor elétrico que tem aproximadamente 90% de sua geração a partir de fontes renováveis, não pode ser alijado da discussão e das medidas a serem adotadas. Esta necessidade se baseia no fato de que a matriz energética brasileira precisa e pode permanecer  com reduzida intensidade em carbono, evitando-se assim que as emissões brasileiras atinjam níveis insustentáveis. Verifica-se que as perspectivas de crescimento da demanda por energia elétrica nos próximos anos tendem a se manter elevadas em razão do crescimento e desenvolvimento econômico, mas há um cenário de referência, derivado dos resultados dos últimos leilões de energia nova realizados em 2007 e 2008 de que esta demanda adicional será atendida em grande parte pela geração a partir de fontes fósseis de energia.

O Brasil tem um enorme potencial de fontes alternativas e renováveis de energia elétrica a ser explorado. Merecem destaque a bioeletricidade das usinas sucroenergéticas e a energia eólica, que podem produzir energia neutra em carbono a custos consideravelmente mais competitivos daqueles necessários para viabilizar fontes renováveis de energia em outros países. Desta forma, a exploração deste potencial pode vir a se constituir em uma oportunidade para a manutenção do caráter limpo da matriz elétrica brasileira. Por outro lado, esta possibilidade concreta se constitui em uma vantagem competitiva derivada do menor custo da geração, como também pode garantir mercado externo para diversos bens que no futuro venham necessitar de certificações de sustentabilidade ambiental para serem comercializados nos países mais ricos.

A questão central que se coloca é como garantir a inserção destas fontes de energia na matriz elétrica brasileira em detrimento da contratação de usinas térmicas movidas a combustíveis fósseis. O argumento dos autores é que devem ser criadas metas para cada uma das fontes componentes da matriz e realizar leilões específicos para cada uma destas fontes, de forma a se viabilizar a contratação e estrutura da matriz definida pelo planejamento como ideal. para o setor elétrico brasileiro.

Com o intuito de analisar este conjunto de questões, o estudo se divide em quatro partes, além desta seção introdutória. A primeira centra-se em uma breve revisão da relevância de se adotar medidas que permitam a estabilização da concentração de gases do efeito estufa em patamares sustentáveis. Ainda nesta seção, se analisará a contribuição dos países desenvolvidos e dos países em vias de desenvolvimento para o aumento do efeito estufa e qual o papel que cada um destes grupos deve ter na mitigação. A segunda seção, examina as perspectivas da matriz elétrica brasileira e o potencial e a viabilidade de inserção da bioeletricidade e da energia eólica nesta matriz. A terceira parte discutirá a necessidade de uma integração entre a política climática e a política energética, que deveria incorporar a variável ambiental como um parâmetro decisivo na determinação dos empreendimentos que irão compor a expansão da matriz elétrica brasileira. Por fim, serão feitas considerações conclusivas relativas ao estudo.

2 – A Necessidade de Mitigar o Aquecimento Global

A biosfera é o conjunto que compreende todos os ecossistemas terrestres. Os impactos ambientais oriundos da ação antrópica podem ocasionar relevantes desequilíbrios sobre os ecossistemas. Dentre estes impactos, as alterações climáticas são os mais relevantes devido à sua amplitude global que ameaça a biodiversidade, a própria exploração dos recursos naturais e, por conseguinte, o desenvolvimento humano na Terra, gerando no limite dúvidas relativas à sobrevivência da humanidade.

Na análise do aquecimento global é necessária inicialmente  ter  ciência de que o efeito estufa é um fenômeno natural. Ele  permite que a temperatura média da Terra seja de 15º C. Caso não ocorresse este fenômeno, a temperatura média da Terra seria 30º C inferior. O efeito estufa consiste basicamente da capacidade do vapor d´água, dióxido de carbono, metano, óxido nitroso, entre outros gases,  absorverem parte da radiação solar que incide sobre a Terra. Dentre estes gases, o vapor d´água é o gás de efeito estufa mais relevante. Porém, ele não é sensível às atividades antrópicas e desta forma o desenvolvimento sócio econômico verificado a partir do advento da Revolução Industrial em meados do século XVIII não alterou sua concentração na atmosfera.  São os compostos orgânicos mais sensíveis à ação antropogênica, que  tiveram suas concentrações aumentadas de forma significativa nos últimos 250 anos, que ocasionaram a intensificação do efeito estufa. Para melhor entender este processo, se faz necessário o conhecimento básico do ciclo biogeoquímico do carbono.

De acordo com RICKLEFS (1996), o solo, as rochas, os combustíveis fósseis, a atmosfera, os oceanos, a biota e a matéria orgânica são os principais reservatórios do carbono. Por sua vez, os métodos como as substâncias são transferidas de um depósito para outro são denominadas processos e consistem basicamente de três itens:

  • Reação que é um processo de curto prazo representado pela respiração e pela fotossíntese;

  • Dissolução que consiste na troca de carbono entre a atmosfera e o oceano; e,

  • Deposição processo de ordem temporal relativa aos milhares de anos, que consiste na transformação de carbono solúvel em carbono insolúvel formando, por exemplo, petróleo e carvão mineral.

Enquanto os processos do ciclo do carbono estavam restritos a estes processos, o sistema encontrava-se em equilíbrio. Entretanto, a partir da Primeira Revolução Industrial o processo de combustão, até então de magnitude irrelevante, foi se tornando em um processo de grande importância ambiental, resultando no desequilíbrio do ciclo do carbono e o conseqüente aumento da concentração dos compostos orgânicos na atmosfera.

Para se ter uma noção da ordem de grandeza do aumento de concentração dos compostos orgânicos na atmosfera, recorre-se ao estudo do IPCC (2007), onde se estima que a concentração de CO2 aumentou de um patamar de 280 ppm no período Pré-Industrial para atingir a cifra de 379 ppm em 2005. Concomitantemente, a concentração de metano teria se elevado de 715 ppb para 1774 ppb no mesmo período.

Devido à necessidade crescente de limitar o aquecimento global, o início da década de 90 marca a criação de um arcabouço institucional mundial para estabelecer metas e criar mecanismos que permitam a redução das emissões de gases do efeito estufa. Um dos princípios basilares deste arcabouço é o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. A diretriz básica deste princípio é que os países desenvolvidos são historicamente os maiores emissores de gases do efeito estufa. Neste sentido, estes países possuem a obrigação de uma maior contribuição no combate ao aquecimento global.

O primeiro compromisso de redução de gases do efeito estufa no âmbito da Conferência das Partes foi o Protocolo de Quioto que estabeleceu uma meta de redução de 5,2% para os países do Anexo B no período compreendido entre 2008 e 2012. Uma questão relevante que se coloca atualmente, em especial após a Conferência de Copenhagen (COP-15), é a necessidade de firmar acordo para o Pós Quioto e em que bases ele será estabelecido.

A consolidação e avanço da certeza científica relativa à influência antrópica sobre o aquecimento global, bem como dos danos nocivos sobre a biosfera resultam na necessidade de adoção de metas mais agressivas e consistentes para redução das emissões de gases do efeito estufa. Com o intuito de limitar o aquecimento global em 2º C até o fim deste século, e desta forma minimizar os impactos negativos das alterações climáticas, é necessário que se estabilize a concentração de gases do efeito estufa em 450 ppm. Para atingir estes níveis, será preciso uma drástica redução das emissões de gases do efeito estufa. Porém, o prazo, a magnitude destas metas e quais serão os países com maiores  metas são objetos de muita controversa, conforme verificado na COP-15.

Merece ser destacado que, de acordo com NOBRE (2009), a redução das emissões de gases do efeito estufa em 50% até o ano de 2050 não será capaz de limitar o aquecimento global em 2º C. Segundo o autor, neste cenário o aquecimento global ficaria contido em um intervalo entre 2,6º C e 2,8º C até o fim do século.

Um ponto de conflito na formatação de um novo acordo do clima é o estabelecimento de metas para países em vias de desenvolvimento. Esta questão  é incompatível com o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. A controvérsia se dá em razão de que estes países necessitam adotar uma rota de desenvolvimento econômico e padrão de consumo de energia distinta daquela traçada pelos países do Norte. Sem estas alterações estruturais, os impactos ambientais serão insustentáveis. Nesta perspectiva, a questão que se coloca é que derivado ao maior comprometimento e  contribuição histórica dos países desenvolvidos para o aquecimento global, estes países deveriam auxiliar, de forma concreta, os países em vias de desenvolvimento na busca e configuração de um  desenvolvimento sustentável através, basicamente, da transferência de recursos financeiros e tecnológicos.

Contudo, países em vias de desenvolvimento do porte de Brasil, China e Índia possuem economias e emissões de gases do efeito estufa de magnitudes que levam os países desenvolvidos a exigirem que estes países assumam compromissos de redução de emissões. Nesta discussão, é fato inegável que estes países possuem condições de reduzir suas respectivas emissões e responder às necessidades de alterações climáticas de forma distinta daquelas dos países pobres, como os africanos e os insulares. Neste sentido, o argumento que a transferência de recursos financeiros e tecnológicos deve ser restrita para mitigação e adaptação às mudanças climáticas nestes últimos países é consistente.

Independente da obrigatoriedade de reduções de emissões em países emergentes, a esfera do comércio internacional  tornará imperativa a transição para a economia verde nestes países. Esta questão pode ser explicada da seguinte forma: investimentos em tecnologias com reduzida intensidade em carbono representam necessariamente maiores custos de produção, o que reduzirá a competitividade das economias dos países desenvolvidos. Desta forma, como medida de compensação se vislumbra uma série de barreiras comerciais a serem estabelecidas com base em critérios ambientais. Estas restrições  só serão transpostas através de certificações de que o(s) produto(s)  ofertado(s)  pelo país em vias de desenvolvimento é ambientalmente sustentável. Esta é uma tendência forte e consistente a ser adotada pelos países do Norte, incluso por dar melhores condições de competitividade para seus produtos.

Do ponto de vista do Brasil, a perspectiva de transição para uma economia verde, indica uma posição nitidamente favorável e competitiva. O Brasil detém uma matriz energética com uma participação de 45% de fontes renováveis de energia em contraste com a matriz mundial, onde a participação de fontes renováveis de energia se situa na ordem de 12%. A condição brasileira de um dos cinco  maiores emissores de gases do efeito estufa com emissões anuais de 2,2 Gt de CO2e  é determinada, essencialmente, pela mudança no uso do solo, sendo o desmatamento responsável por aproximadamente 60% das emissões brasileiras (MCT, 2009).  A Tabela 1 apresenta dados sobre o perfil das emissões brasileiras em comparação com outros países e com a média mundial.

Tabela 1: Comparação das Emissões de Gases do Efeito Estufa por Grupo de Países e Tipo de Atividade.(*)  (em %)

Região/País

Energia

Transporte

Processos industriais

Agricultura

LULUCF (**)

Lixo

Total

Mundo

48,8

11,8

3,4

13,8

18,6

3,6

100

Anexo I

63,3

18,6

3,6

8,2

-

6,2

100

Não-Anexo I

36,9

6,1

3,2

15,6

35,1

3,0

100

China

64,6

4,6

7,9

21,4

-1,0

2,5

100

Índia

52,3

6,8

3,5

34,8

-2,2

4,8

100

Indonésia

7,9

2,0

0,5

4,0

83,6

1,9

100

Coréia do Sul

68,8

17,5

9,2

2,8

0,2

1,6

100

Brasil

8,8

5,7

1,5

20,1

62,0

1,8

100

México

50,5

16,6

3,5

8,2

15,8

5,3

100

África do Sul

73,7

9,6

2,7

10,7

0,5

2,9

100

Fonte: SOUZA (2006).

(*) Os dados referentes ao Brasil são do inventário publicado em 2004
relativos ao período compreendido entre 1990 e 1994.(**)Mudança no uso do solo.

Frente ao perfil das emissões brasileiras é evidente que uma política de redução das emissões de gases do efeito estufa deve ter como foco principal a contenção do desmatamento. A Lei de Mudanças Climáticas brasileira é condizente com este objetivo. Mesmo assim, é preciso que exista uma integração entre as diretrizes da política energética brasileira com a estratégia de redução de mudanças climáticas. A busca desta aderência institucional entre as duas políticas se deve à necessidade do Brasil manter, e mesmo melhorar, a matriz energética com reduzida intensidade em carbono, com o intuito de realizar uma efetiva transição para uma economia verde, transição esta bem menos dolorosa e cara do que a da maioria dos países. Uma estratégia nesta direção permitiria ao Brasil aproveitar as novas vantagens econômicas de uma produção sustentável ambientalmente, ampliando ainda mais a competitividade econômica - energética do Brasil.

Neste sentido, o Brasil se encontra em uma condição extremamente favorável para a implementação da economia verde. O Brasil já explora fontes renováveis de energia em larga escala e detém um grande potencial ainda a ser explorado em bases extremamente competitivas, como é o caso da energia eólica, bioeletricidade no setor elétrico, bem como do etanol como insumo energético na frota de veículos leves.

3 – Perspectivas da Matriz Elétrica Brasileira

A matriz elétrica brasileira possui uma composição ímpar em relação ao resto do mundo com participação de geração hidroelétrica na ordem de 90%. Esta participação é muito expressiva para um mercado com a dimensão e escala do brasileiro. Esta matriz tem como base a existência de centrais hidroelétricas com grandes reservatórios que estocam água no período úmido do ano, permitindo a sua conversão em energia elétrica no período seco do ano. São estes reservatórios que possibilitam uma oferta regular de energia elétrica ao longo de todo ano, mesmo com um regime hidrológico irregular.

No entanto, embora ainda existam mais de 150 GW de recursos hídricos a serem explorados, a maior parte deste potencial se localiza na Região Norte do país, que é geograficamente plana. Esta característica física irá limitar a construção de grandes reservatórios, ocasionando uma crescente redução da capacidade de regularização da oferta de energia elétrica. Esta redução da capacidade de regularização da oferta de energia associada à demanda crescente por energia elétrica torna necessária a diversificação da matriz energética brasileira com a inserção de outras fontes, especialmente aptas para operarem na base do sistema no período seco do ano (CASTRO et al, 2010). Uma das questões cruciais para o planejamento do setor elétrico brasileiro é determinar uma política energética de complementaridade à fonte hídrica, convergente com a política global de redução do efeito estufa.

Para analisar alternativas para a busca de elementos para esta política energética, deve-se partir do fato de que se configura uma transição da matriz elétrica brasileira de uma estrutura hídrica para  uma composição hidrotérmica.

 O Plano Decenal 2008-2017 elaborado pela EPE já aponta e atenta para esta evolução: as fontes fósseis de energia têm previsão de aumento de participação na oferta brasileira de energia elétrica de 11% em 2008 para 17% em 2017. As estimativas para 2017 devem-se ao aumento de empreendimentos termoelétricos movidos a combustíveis fósseis, resultantes dos últimos leilões de energia nova para entrega de energia elétrica em 3 e 5 anos (A-3 e A-5) realizados nos anos de 2007 e 2008. Contudo, esta direção de transição da matriz vai contra a política ambiental.  Os resultados desses leilões são incompatíveis com a racionalidade e potencial de expansão do setor elétrico brasileiro, considerando além do potencial hidroelétrico, a bioeletricidade e energia eólica. Estas duas fontes renováveis apresentam possibilidades concretas de ampliação da participação na matriz.

Mesmo com esta possível ampliação da inserção de empreendimentos térmicos no parque brasileiro e o conseqüente aumento da geração termoelétrica na oferta brasileira de energia elétrica, a participação das fontes renováveis de energia na oferta brasileira permanecerá significativamente acima da média  verificada nos países desenvolvidos com a implementação de metas ambiciosas de promoção de fontes renováveis de energia, como é o caso da União Européia. Entretanto, mesmo com o atual status do Brasil no campo da energia elétrica, não seria prudente aceitar  o cenário que se configurou com os últimos leilões de energia nova, com a contratação maciça de usinas termoelétricas movidas a recursos fósseis. Há a necessidade de serem promovidos ajustes com o intuito de manter e até mesmo acentuar o caráter limpo da matriz brasileira. Esta para ser uma das formas estratégicas para se estabelecer efetivamente uma economia verde.

A Tabela 2 ilustra com clareza o impacto negativo da inserção de térmicas a óleo em relação às emissões de gases do efeito estufa, caso se concretize as estimativas do Plano Decenal 2008-2017.

Tabela 2: Emissões de CO2 de diferentes Fontes de Geração

(Kg por MWh)

Fonte de Energia

Emissão de CO2

Gás Natural (ciclo aberto)

440

Gás Natural (ciclo combinado)

400

Óleo

550

Carvão

800

Hidroelétrica

25

Eólica

28

Fonte: União Européia (2006).

Uma justificativa para a opção por empreendimentos poluentes seria o custo maior das fontes menos intensivas em carbono, induzindo assim para uma maior contratação de projetos com alto teor de carbono em prol da modicidade tarifária. Porém, recorrentes estudos do GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia da UFRJ vêm demonstrando que a aparente competitividade de projetos térmicos nos leilões de energia nova tem como base falhas metodológicas do ICB, que tem dado maior competitividade às fontes poluidoras nos leilões genéricos de energia nova, em detrimento de fontes renováveis, notadamente bioeletricidade e eólica. Portanto, o custo da energia não seria capaz de justificar o perfil da expansão da oferta brasileira de energia verificada nos últimos leilões.

Mesmo no caso em que os empreendimentos térmicos movidos a combustíveis fósseis tivessem, de fato, custos inferiores aos empreendimentos baseados em fontes renováveis de energia, a promoção destas últimas se torna imperiosa na medida que existe necessidade de estabelecer e pautar o  desenvolvimento econômico em  bases sustentáveis, assinalando-se que a própria economia verde oferece vantagens econômicas que irão no médio prazo compensar os maiores custos das fontes alternativas de energia.

Em relação ao Brasil, ao se analisar os custos da promoção de fontes renováveis de energia é uma premissa bastante plausível que estas fontes tendem a ganhar  e deter  maior competitividade em relação aos outros países. Esta premissa  permite que a adoção da economia verde no âmbito energético possua menores custos e se processe de forma mais rápida em comparação a outros países. Desta forma, se faz necessária uma análise do potencial de inserção, dos custos e dos benefícios ambientais da bioeletricidade sucroenergética e da energia eólica, as duas fontes alternativas e renováveis de energia passíveis de serem inseridas na matriz elétrica brasileira no curto prazo.

3.1 - Bioeletricidade Sucroenergética

A energia da cana de açúcar é a segunda fonte de energia da matriz energética brasileira devido essencialmente ao Programa Brasileiro de Álcool iniciado em 1975. Os resultados deste programa garantiram e permitem a utilização de etanol em larga escala no modal de veículos leves e, em um segundo plano, na geração de energia elétrica para as usinas, e mais recentemente para utilização pelo setor elétrico brasileiro. No entanto, ainda existe um grande hiato entre o potencial energético da cana de açúcar e a energia que vem sendo de fato explorada. De acordo com KITAYAMA (2008), uma tonelada de cana de açúcar possui energia primária equivalente a 1,2 barris de petróleo. Desta energia, um terço está contida na sacarose e é plenamente utilizado na produção de etanol. Os outros dois terços estão contidos no bagaço e na palha, mas apenas uma reduzida parte é utilizada atualmente para a produção de energia térmica e eletricidade para auto-suprimento e para a venda nos mercados cativo e livre.

A alternativa econômica atualmente mais viável de exploração do potencial energético do bagaço e da palha advém da queima desta biomassa com a finalidade de geração de energia elétrica para  ser comercializada. Os novos projetos sucroenergéticos – greenfield - já incorporam em seus planos de negócio  a comercialização de energia elétrica em conjunto com o foco principal que é a produção de etanol e/ou de açúcar. Os novos projetos têm como tecnologia padrão a extra-condensação que permite a geração de 80 KWh excedentes por tonelada de cana processada, utilizando-se apenas o bagaço. No entanto, as plantas construídas durante os anos 70 e 80 – retrofit - utilizam tecnologias antigas e bem menos  eficientes capazes de produzir modestos 12 KWh por tonelada de cana processada, atendendo basicamente as necessidades energéticas próprias, sem capacidade de vender para o mercado elétrico. Cabe frisar que a tecnologia de ruptura será a gaseificação da biomassa com a conseguinte utilização do gás da síntese para a produção de eletricidade. Esta rota tecnológica poderá produzir algo em torno de 270 KWh por tonelada de cana processada através do ciclo combinado (CORRÊA NETO e RAMÓN, 2002).

Como grande parte da safra canavieira é processada em usinas antigas, as quais podem prosseguir operando por mais algumas décadas, a plena exploração do potencial energético da cana de açúcar requer a modernização destas usinas através da implementação de plantas de co-geração capazes de gerar maiores montantes de excedentes de energia elétrico, a serem “exportados” para o setor elétrico brasileiro.

É importante assinalar que a estimativa de 80 KWh excedentes por tonelada de cana processada com base em turbinas de extra-condensação se refere à utilização apenas do bagaço de cana. Até recentemente esta era a única biomassa residual tecnologicamente viável para ser utilizada nas usinas sucroenergéticas como combustível. No entanto, o gradativo fim da prática das queimadas, por imposição da legislação ambiental irá disponibilizar grande quantidade de palha, que será utilizada como insumo energético nas usinas. A utilização da palha para a produção de bioeletricidade permitirá uma produção estimada em torno de 200 KWh por tonelada de cana processada ou a produção de eletricidade no período da entressafra.

Segundo SOUSA (2009), na safra 2008/09 foram processadas 562 milhões de toneladas de cana e se projeta que na safra 2010/11 se processe 1.038 milhões de toneladas de cana. Um exercício simples: partindo-se do pressuposto da adoção da tecnologia de extra-condensação em todas as usinas, mais a utilização de 75% do bagaço e 50% da palha disponíveis, será possível  obter  energia elétrica média de 13.158 MW. Para se ter uma dimensão da relevância deste número, a energia firme da maior hidroelétrica do mundo, UHE de Itaipu, é de 9.699 MWmed.

Portanto, diante deste  significativo potencial de geração de eletricidade, derivado diretamente dos resíduos da produção de etanol e açúcar, utilizando-se o processo de co-geração, mais a compatibilidade desta geração com os objetivos de promoção de fontes renováveis de energia e da utilização de processos de considerável eficiência energética como meio de reduzir as emissões de gases do efeito estufa do setor energético, a inserção da bioeletricidade em uma escala condizente com sua potencialidade é, indiscutivelmente, um importante mecanismo de manutenção do caráter limpo da matriz brasileira em linha com a transição para a economia verde.

Uma importante questão a ser discutida é o custo da bioeletricidade em relação aos custos das fontes de geração convencionais. O Leilão de Energia de Reserva realizado em 2008, específico para a  contratação  de bioeletricidade, comercializou energia a um preço médio de R$ 155,70 por MWh. A título de comparação, o leilão genérico de energia nova A-5 de 2008 teve um preço médio de R$ 145,23. De acordo com estudo publicado em 2008 (ver CASTRO et al.), projetos greenfield de co-geração sucroenergética seriam na época viabilizados com uma tarifa de R$ 155,00 sem a necessidade de comercializar créditos de carbono. Logo, nota-se que com base nestes parâmetros monetários, os projetos de bioeletricidade estão próximos do limiar de competitividade com projetos térmicos convencionais. Os autores enunciam que para projetos retrofits a tarifa de equilíbrio seria, à época, da ordem de R$ 180,00. Este diferencial de valores define e indica  a necessidade de uma política econômica e energética específica, focada na  redução dos custos deste tipo de projeto através, por exemplo, da adoção de instrumentos como desoneração tributária.

3.2 - Energia Eólica

Dentre as fontes renováveis e alternativas de energia elétrica que estão sendo promovidas em nível mundial, a energia eólica vem adquirindo destaque e relevância crescente. Esta tendência se deve ao fato do vento ser um recurso abundante e distribuído por todo o mundo. Além disto tende a se mostrar  gradativamente mais competitivo em relação às outras fontes renováveis de energia, como por exemplo, a energia solar. Neste sentido, dado o aumento da demanda por energia elétrica e à necessidade de aumentar a participação de fontes renováveis de energia na matriz elétrica mundial, foram criados, nos últimos anos, consistentes programas de promoção de energia eólica em uma série de países. Estes programas atuam pelo lado da demanda através, por exemplo, do estabelecimento de sistemas feed-in, assim como por políticas pelo lado da oferta como a desoneração tributária. Estas políticas permitiram que a capacidade instalada de turbinas eólicas ao redor do mundo sofresse um acréscimo expressivo de 6.100 MW em 1996 para 120.791 MW ao fim de 2008.

Os recursos eólicos brasileiros são de qualidade superior à média mundial em termos de quantidade e qualidade, medidas pela regularidade e intensidade. O potencial eólico brasileiro estimado ainda em 2001, é de 143.000 MW. Além deste potencial, o  sistema elétrico brasileiro apresenta características extremamente propícias à inserção da energia eólica em bases mais competitivas que às de outros países. Do ponto de vista técnico, o caráter intermitente da energia eólica exige a presença de capacidade instalada ociosa. O parque gerador instalado tem que ser diversificado e superior à demanda de ponta do sistema para poder suportar eventuais reduções abruptas da geração eólica, dada a sua imprevisibilidade e incapacidade de previsão, mesmo de curto prazo. Por exemplo, países com elevada participação de energia eólica na matriz, como Portugal, estão enfrentando problemas em razão da necessidade de construir centrais térmicas para atuarem como back-up e suportarem assim as quebras de geração eólica.

O Brasil não se depara com este tipo de problema nem na necessidade de realizar investimentos suplementares, pois o parque gerador brasileiro, de base hidroelétrica, já possui uma significativa capacidade ociosa. Sua potência total instalada é superior a 100.000 MW para atender uma demanda de ponta média de 64.000 MW. Apesar do grande potencial de geração eólica e de possuir um sistema elétrico propício à inserção da energia eólica, a potência instalada atual no Brasil é irrisória, com pouco mais de 600 MW. A previsão é de atingir o patamar de 1.427 MW ao final de 2010. Estes valores estão bastante aquém da potência instalada de países como EUA, Alemanha e China que terminaram o ano de 2008 com potências instaladas de 25.170 MW, 23.903 MW e 12.210 MW, respectivamente.

A justificativa mais plausível para a inércia dos investimentos em empreendimentos eólicos no Brasil é que a participação de fontes renováveis na matriz elétrica brasileira já é muito expressiva, relegando para segundo plano investimentos em fontes alternativas. Soma-se a este fator o incipiente desenvolvimento da indústria de aerogeradores nacional, fato que  eleva o custo do investimento em equipamentos, que é o item mais expressivo da estrutura de custo do empreendimento eólico.

O Leilão de Energia de Reserva específico para energia eólica realizado em Dezembro de 2009 deve ser entendido como um marco inicial  de uma nova fase para a energia eólica. O seu resultado refletiu o êxito de uma política energética geral que vem se ajustando na direção de buscar promover a ampliação das fontes renováveis na matriz.

 Neste certame foram contratados 753 MWmed, o que representa uma adição de 1.806 MW ao parque gerador brasileiro. O preço médio do leilão de R$ 148,39 por MWh surpreendeu e mostra um  flagrante contraste com uma tarifa de equilíbrio para a energia eólica da ordem de R$ 180,00. Estes resultados refletem  a eficácia da política de redução de custos que contemplou:

Desoneração tributária;

Isenções fiscais;

Desconto na tarifa fio; e

Condições especiais de financiamento via BNDES.

 A sinalização dada por esta política consistente de contratação de energia eólica permitiu  atrair grupos dispostos a investir em fábricas de turbinas eólicas no Brasil, o que permitiu reduzir os custos de investimento para este leilão, e principalmente para os próximos.

A política brasileira de redução de custos da energia eólica seguiu as mesmas diretrizes daquelas adotadas em outros países que foram capazes de impulsionar o dimensionamento desta fonte de energia. Desta forma, o Leilão de Energia de reserva para energia eólica de 2009 deve ser analisado como o início de uma política consistente de contratação desta fonte de energia e não como um evento isolado. A adoção de uma política sistemática de contratação de energia eólica além de contribuir com a segurança do sistema elétrico brasileiro é condizente com o objetivo de se fazer a transição para a economia verde.

4 – O Planejamento do Setor Elétrico Brasileiro

O atual modelo do Setor Elétrico estabelecido em 2004 possui como principal instrumento de expansão da oferta a realização de leilões. O objetivo central dos leilões é garantir que a oferta se expanda de forma a atender ao crescimento da demanda com o menor custo de geração possível, em linha com a necessidade de se garantir a modicidade tarifária, um dos pilares do marco regulatório do setor elétrico brasileiro.

Entre os tipos de leilões usados, destaca-se o leilão genérico que permite a competição, no mesmo certame, de projetos que utilizam diferentes fontes de energia. Esta formatação da contratação de energia por leilões genéricos é conflitante com o planejamento do setor elétrico. A partir do momento em que o leilão é genérico e não se sabe, a priori, qual a tipologia dos empreendimentos vencedores, logo pode surgir um elemento de contradição entre o resultado do leilão e o planejamento elétrico definido e formulado ex ante.  Por exemplo, o planejamento define para 10, 15 e 30 anos a participação da energia hidroelétrica na matriz. Mas dada as dificuldades de se ofertar empreendimentos hidroelétricos nos leilões devido a morosidade dos processos de licenciamento ambiental e a falta de inventário nos anos 90, os leilões genéricos não contratam energia desta fonte. Como há outras fontes participando do leilão, elas suprem esta carência para equilibar a oferta com a demanda futura, mas criam o paradoxo do planejamento ex-post a cada leilão genérico.

Neste sentido, o planejamento do setor elétrico brasileiro adquire a formatação de  um planejamento ex-post aos resultados dos leilões genéricos, tendo em vista que  são os resultados dos leilões genéricos que definem a estrutura futura da matriz. Esta parece ser  uma contradição com o conceito de planejamento que, por definição, é algo ex-ante.

A definição da metodologia adotada em um leilão genérico é por si só bastante complexa e difícil, refletindo a própria dificuldade de criar metodologia e instrumentos de cálculo capazes de possibilitar a comparação correta entre empreendimentos com características absolutamente distintas. O Índice Custo Benefício - ICB, base desta metodologia, é adotado nos leilões de energia nova. Ele  apresenta deficiências metodológicas, conforme assinalado por CASTRO et al. (2009). De forma resumida, este índice é uma provisão de custos dos empreendimentos que se apresenta enviesado a favor da contratação de usinas térmicas flexíveis com elevados custos variáveis.

Em um sistema hídrico em que usinas térmicas com elevado custo variável sejam despachadas em um reduzido número de horas por ano, a contratação por disponibilidade deste tipo de empreendimento justifica-se porque estas usinas térmicas exercem, de forma eficiente, a função de back-up do sistema. Entretanto, em um sistema que necessitará de geração complementar ao parque hídrico de forma contínua no período seco do ano, estes empreendimentos são inadequados porque não possuem vocação para operar na base e aumentarão de forma significativa o custo da geração do setor elétrico na medida que venham a ser despachados em um número de horas superior aquele estimado quando do cálculo do ICB. Desta forma, verifica-se que a dificuldade dos empreendimentos de bioeletricidade e eólicos, assim como de térmicas inflexíveis a gás natural, em serem competitivos nos leilões genéricos está associado, em grande medida, às regras do certame.

Contudo, como o objetivo deste estudo é discutir os benefícios econômicos de investimento em fontes renováveis e as melhores alternativas de energia elétrica em um contexto de transição para a economia verde, se adotará para efeito analítico comparativo a hipótese de que o valor do (ICB) Índice Custo Benefício é, de fato, o custo da energia dos empreendimentos térmicos contratados nos leilões de energia nova. Eles serão considerados como o preço da energia convencional a ser comparado com os preços da energia de empreendimentos de fontes renováveis e alternativas.

Com base na perspectiva da colheita de 902 milhões de toneladas de cana na safra 2017/18 e com os pressupostos técnicos apresentados na seção anterior, é possível se estimar, em termos arredondados, um potencial de 10.000 MWmed nas usinas sucroenergéticas ao final do ano de 2017. Esta capacidade representará uma geração estimada de 89 TWh. Ao se comparar com geração equivalente oriunda de usinas térmicas a óleo pode-se estimar uma emissão evitada de 49 milhões toneladas de CO2. Ao se comparar o preço médio de R$ 145,23 por MWh do leilão A-5 com o preço médio do leilão de biomassa de R$ 155,70 por MWh conclui-se que o custo da tonelada de carbono evitada foi de R$ 19,03, valor bastante aquém do custo de abatimento em outros países. Mesmo para uma usina retrofit com uma tarifa de equilíbrio em torno de R$ 180,00, o custo de abatimento seria em torno de R$ 63,22 por tonelada de CO2, valor ainda muito competitivo com o custo de abatimento em uma série de países, especialmente no cenário de adoção de metas mais ambiciosas de redução.

Análise análoga pode ser realizada para empreendimentos eólicos. Por hipótese, admitindo-se que com o desenvolvimento da indústria de turbina eólica nacional o preço que viabilize a energia eólica, sem considerar as políticas de incentivos, seja de R$ 160,00 por MWh, este valor representa um custo de abatimento de R$ 26,85 por tonelada de CO2.

Portanto, independente do Brasil assumir compromissos formais de reduções de emissões, destaca-se o  fato concreto de que o custo de abatimento das emissões de gases do efeito estufa no setor elétrico brasileiro é extremamente competitivo. Desta forma, isso credencia e dá ao Brasil vantagens comparativas na transição para a economia verde em comparação com outros países, seja pela mera comercialização de créditos de carbono, seja  pelo menor custo de produção de mercadorias sustentáveis em termos ambientais.

O planejamento do setor elétrico brasileiro deve atentar para a importância e  necessidade da promoção do desenvolvimento sustentável. Neste sentido, a variável ambiental deve ser contemplada na análise de quais os empreendimentos que devem ser inseridos na matriz elétrica brasileira. A formatação de um instrumento com base em metodologia consistente que possibilite comparar empreendimentos de fontes de geração distintas, em um padrão de geração de predominância hidrelétrica é extremamente difícil, ainda mais ao se incorporar a variável ambiental.

Desta forma, e por estas razões, os leilões genéricos devem ser substituídos por leilões específicos. O planejamento deve determinar e indicar parâmetros para a participação que cada fonte de energia, buscando e convergindo para uma  matriz ideal.

A competitividade de projetos greenfield de bioeletricidade e o êxito da política de redução de custos da energia eólica indicam as possibilidades e pertinências para a  realização de leilões específicos que, pelos resultados já obtidos, indicam  o não comprometimento da busca da modicidade tarifária.

5 - Considerações Finais

Os tomadores de decisão a nível mundial estão diante do desafio de assegurar o equilíbrio da biosfera tal e qual existe atualmente em meio às ameaças relacionadas com as alterações climáticas já em curso.  A única resposta possível a este desafio é promover políticas que viabilizem a redução drástica da emissão de gases do efeito estufa com o objetivo de estabilizar a concentração destes gases na atmosfera em níveis que não ocasionem efeitos excessivamente danosos sobre os ecossistemas terrestres e conseqüentemente sobre todos os habitantes do planeta Terra. Devido a sua maior contribuição histórica nas emissões de gases do efeito estufa, a maior parte da responsabilidade do esforço deve ser realizada pelos países desenvolvidos. Duas são as principais estratégias: estabelecimento de metas internas de redução de emissão de gases de efeito estuda e a transferência de recursos financeiros e tecnológicos para os países em vias de desenvolvimento.

Entretanto, é uma hipótese plausível que um país com a economia do porte da brasileira esteja incluído no novo acordo climático, seja pelo estabelecimento de metas de redução ou ao menos assumindo compromissos voluntários de redução com recursos próprios. Embora a maior parte das emissões brasileiras estejam relacionadas ao desmatamento e logo o combate do mesmo deve ser o foco da política de mudanças climáticas brasileira, o setor energético precisa manter seu caráter de reduzida intensidade em carbono. Desta forma, a política energética deve estar alinhada com a política de mudanças climáticas.

O argumento dos autores é que o Brasil deve encarar a promoção de fontes renováveis de energia, especialmente no setor elétrico, como uma oportunidade porque esta promoção é condizente com o objetivo de se estabelecer a economia verde e o Brasil possui condições excepcionais para realizar esta transição com custos inferiores aos de outros países. No setor elétrico, o potencial de geração de bioeletricidade e de energia eólica permite que se vislumbre a manutenção do caráter sustentável da matriz brasileira sem que se crie atrito com os custos de geração, desde que haja uma política consistente de inserção destas fontes na oferta brasileira de energia elétrica.

O efetivo aproveitamento das oportunidades descritas no parágrafo anterior requer que o planejamento do setor seja de fato executado, o que vem sendo dificultado pelo uso dos leilões genéricos de energia de energia. Neste sentido, existe a necessidade que os leilões de energia sejam segmentados por tipo de fonte de tal forma a permitir a contratação da matriz delineada no planejamento do setor que atenda os requisitos de segurança, economicidade e sustentabilidade ambiental pré-estabelecidos.

6 - Referências Bibliográficas

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Thursday, 03 November 2011
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