Economia & Energia
Ano X - No 55:
Abril-Maio 2006
ISSN 1518-2932

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A Evolução da Concentração de Metano na Atmosfera

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Texto para Discussão:

 A Evolução da Concentração de

Metano na Atmosfera

Carlos Feu Alvim

feu@ecen.com

Omar Campos Ferreira

José Israel Vargas

Introdução

O gás metano tem sido apontado como o segundo maior contribuinte para o incremento do efeito estufa proveniente das atividades produtivas do homem. A evolução secular da concentração desse gás na atmosfera do planeta ressalta a importância da responsabilidade dessas atividades no incremento do efeito estufa. Sua análise e projeção, através de modelagem já testada noutros sistemas, podem fornecer indicações sobre a evolução do fenômeno, bem como das ações recomendáveis para mitigá-lo.

Este trabalho examina a evolução do teor de metano na atmosfera usando resultados de medidas obtidas em ar armazenado em geleiras ao longo de um milênio e de algumas medidas mais recentes diretamente na atmosfera; também discute a pertinência do critério atualmente adotado para contabilizar as emissões de metano para o estabelecimento dos créditos de carbono definidos no Protocolo de Quioto.

O Metano e o Aquecimento Global

De acordo com estimativa da EPA (United States Environmental Protection Agency)[i] o gás metano (CH4) é responsável por 23% do efeito observado dos teores verificados desde a era pré-industrial, até hoje. Sua contribuição só não é maior que a do gás carbônico (CO2) responsável por 70% do total.

As características de retenção do calor na atmosfera desse gás, superiores à do gás carbônico (CO2), levaram o Protocolo de Quioto a estabelecer uma equivalência entre eles de um fator 21 em massa (1 tonelada de CH4 é equivalente a 21 tonelada de CO2) na geração de efeito estufa. O carbono emitido sob a forma de metano teria um efeito 8 vezes maior que o do gás carbônico* no qual, em longo prazo, será convertido. Além disto, esta sistemática leva naturalmente em conta a emissão, não considerando o tempo de permanência do CH4 na atmosfera, que é efetivamente muito menor do que o observado para o CO2.

A contabilidade das emissões tornou-se regra corrente no âmbito do Protocolo. Em conseqüência, a redução buscada da emissão de metano tem sido comercializada baseando-se nessa equivalência.

O Brasil tem argüido sem sucesso que o efeito de longo prazo deveria ser levado em conta e assim as regras iniciais continuam sendo observadas no comércio de crédito de carbono. A equivalência definida pelo Protocolo de Quioto prevalece, inclusive, no que tange os projetos brasileiros já que o crédito de carbono é contabilizado no mercado internacional.

 

Evolução da Concentração de Metano na Atmosfera Global

O conhecimento da evolução do teor de metano na atmosfera ao longo do tempo é essencial para avaliar a contribuição da atividade humana em sua acumulação. O ar capturado em geleiras costuma ser uma fonte interessante para esse tipo de estudo, vez que existem processos de datação que permitem avaliar a idade de amostras colhidas em diferentes profundidades. Como o teor de metano tende a homogeneizar-se na atmosfera, as medidas realizadas com amostras de uma geleira são bastante representativas do teor global na ocasião em que o ar foi aprisionado pelo gelo. Em anos recentes, as medidas passaram a ser realizadas diretamente pela coleta de ar atmosférico em regiões livres de poluição local significativa.

A análise deste artigo concentra-se no exame dos resultados relacionados no trabalho de D.M. Etheridge et al.[ii] que cobrem mil anos. As amostras foram recolhidas em geleiras tanto da Groenlândia como da Antártica; já aquelas recolhidas diretamente da atmosfera o foram em estação do Cabo Grim (Tasmânia). Também foram analisadas amostras de gelo da Antártica mais recentes para teste da metodologia usada para analisar o possível papel da difusão do metano no gelo.

Os resultados referentes ao teor de metano ao longo dos anos são mostrados na Figura 1.

Figura 1: Teor de metano na Atmosfera a partir de medidas em geleiras da Antártica e da Groenlândia e nas amostras ambientais, colhidas na Tasmânia.

Pode-se observar na Figura 1 que até o ano de 1800 os teores de metano permaneceram praticamente constantes, não sendo também significativas as diferenças de concentrações nos pólos opostos até o século XIX.

A presente análise estará restrita ao período transcorrido entre 1900 e 2000 onde ocorreram quase 90% do aumento observado no milênio. Foi constatada a conveniência de efetuar o ajuste dos dados para o período 1940 a 2000 que descrevem melhor a dinâmica observada no último período. Os dados dos anos anteriores foram usados para estabelecer uma linha de base para o ocorrido no período descrito.

A metodologia utilizada já descrita em numerosos artigos de C. Marchetti e adotada por J. I. Vargas[1] para uma série de fenômenos naturais e sociais, presta-se a situações em que o crescimento de um elemento introduzido no sistema é inicialmente acelerado e posteriormente tolhido ou saturado pela sua própria presença no sistema em exame.

A evolução pode ser descrita como resultante de uma curva do tipo logística obtida pela razão dos dados pertinentes entre o estado inicial e o final. Usando-se um algoritmo adequado (de Fisher-Pry), que implica em uma mudança de escala, é possível ajustar o conjunto dos dados a uma reta. Para fazê-lo é necessário determinar o nível de saturação (valor máximo) que propicia o melhor ajuste para o conjunto de dados disponível para o período. Este tipo de determinação para o valor de saturação é o aconselhado quando não existe um limite físico claro do “nicho” a ser ocupado pela grandeza em estudo.

Várias das análises realizadas com a metodologia  revelam a presença de mais de um ciclo de acumulação, sendo conveniente para a previsão de valores futuros trabalhar-se com o ciclo dos anos mais próximos como foi feito nesta abordagem.

Apenas para relembrar a metodologia, recorda-se que nela supõe-se que o valor de uma grandeza possa ser descrito por uma curva do tipo:

Y(t) = Ymax/[1 + e-a(t-to)]

onde Y(t) é uma função do tempo t, sendo a e to constantes.  Ymax é o valor máximo da função denominada logística. Sendo f = Y/Ymax tem-se

Ln (f/(1-f)) = a (t - to)

que permite representar linearmente o comportamento da variável. O tempo to representa o ponto de inflexão da curva e o de maior derivada. É ainda comum referir-se ao intervalo Δt que assinala o tempo em que a curva passa de 10% para 90% do seu valor máximo.

Os teores de metano representando o período 1900/2000, bem como os valores de sua variação média anual (intervalo mínimo de cinco anos), estão representados na Figura 2. Note-se que o máximo de acréscimo anual situa-se em torno de 1975. Em uma curva logística este valor corresponderia à metade da variação total esperada.

Figura 2: Valores do teor de metano e da média da variação anual que passa por um máximo centrado em torno de 1975.

O ajuste da curva logística foi usado para estudar o acréscimo observado para o período 1940 a 2000. Os teores para esse período foram subtraídos do valor de base de 954 ppb (teor médio no período anterior 1900 a 1940).

Os dados estão apresentados na Figura 3. A reta representa o melhor ajuste dos dados, considerados diferentes valores máximos do teor futuro de metano. Também estão indicados na figura:

§         O “nicho” de 936 ppb de variação sobre a base considerada que aponta para um valor máximo de cerca de 1900 ppb[2],

§         O ponto to = 1975 que corresponde ao ano em que teria sido atingida a metade da variação total de teor,

§         Δt = 69 anos que corresponde ao intervalo entre 10% e 90% do acréscimo esperado.

Em 1995 os valores já representavam 80% da variação total prevista e 90% seria atingido no ano de 2010[3].

Figura 3: Ajuste para acréscimo do teor em relação a média de período anterior para o período 1940-2000

Figura 4: Ajuste para o período 1940 a 2004 e projeção para teor de metano até 2020.

Na Figura 4 são representados os dados observados e o ajuste com a previsão da evolução dos teores no futuro. Medidas posteriores do mesmo laboratório (CSIRO, Austrália)[4] constataram que não houve crescimento do teor de metano na atmosfera entre 1999 e 2003.

Deve-se lembrar que no relatório da EPA, já mencionado, o acréscimo de emissão de metano entre 1990 e 2000 teria sido de apenas 1,1%. Esta redução foi principalmente devida à crise econômica em países que integravam a União Soviética e a menor emissão em alguns países da OCDE (não EUA). O menor ritmo de crescimento das emissões não explica, contudo, a redução observada no crescimento do teor de metano na atmosfera uma vez que as emissões no período, mesmo crescendo pouco, são as maiores observadas ao longo de um milênio e o teor na atmosfera se supõe cumulativo, com vida média na atmosfera entre 10 e 20 anos.

Conclusão

O crescimento do teor de metano na atmosfera já dá sinais de saturação como mostra o ajuste para o século passado. Pelo comportamento da curva (máximo de variação em 1975) esta saturação não é devida às medidas adotadas após o Protocolo de Quioto

A equivalência para o metano, fixada pelo Protocolo, pode estar induzindo países (inclusive o Brasil) à adoção de medidas para a redução da emissão de metano cuja eficácia para atenuar o efeito estufa é questionável. Esta tem sido, aliás, a posição dos representantes brasileiros na Convenção que questionam a contabilidade das emissões desconsiderando os efeitos de longo prazo. Confirmada a tendência atualmente observada, do teor de metano não estar crescendo como previsto, acrescenta-se mais uma razão para o assunto ser revisto.

Embora a adoção dessa equivalência possa vir a facilitar o cumprimento dos compromissos de nações que se obrigaram a fazê-lo, essa prática pode se tornar insustentável frente a evidências técnicas e científicas que indiquem que as medidas para evitar sua emissão não têm a eficácia anunciada para reduzir o efeito estufa.

No caso do Brasil, que não está obrigado à redução das emissões no âmbito do Protocolo de Quioto, existem vários projetos para a obtenção de crédito de carbono já aprovados, baseados na redução de metano. Esses projetos poderiam ser prejudicados se fosse modificado o coeficiente atualmente utilizado para esse gás.

Por outro lado, deve-se considerar que a supervalorização do efeito da redução da emissão do metano faz baixar o preço do crédito de carbono por tonelada equivalente de CO2. Com isso os projetos na área de biomassa são duplamente prejudicados: por um lado o eventual crédito de carbono pela eliminação de CO2 é reduzido pela emissão simultânea de metano que ocorre nestes processos, por outro lado o preço pago pela eliminação da emissão de CO2 tem seu valor deprimido. Em um horizonte de maior tempo também deve ser considerado que a supervalorização das reduções emissões de metano pode estar dando relevância indevida a fenômenos como a emissão pelo rebanho bovino onde a participação do Brasil é relevante.


 

[1] Vários exemplos de aplicação desta metodologia pelos dois autores mencionados acham-se reunidas no artigo de J. I. Vargas: A Prospectiva Tecnológica: Previsão com um Simples Modelo Matemático publicado nos Nos  44  e 45 desta revista.

[2]  954+936= 1890 ppb

[3] 1075 + 69/2 ≈ 2010

[4] Greenhouse methane levels stop rising Bob Beale, ABC Science Online, 25 November 2003


 

[i] Global Anthropogenic Non-CO2 Greenhouse Emissions: 1990-2020. EPA December – 2005 (Draft)

[ii] Historic CH4 records from Antarctic and Greenland ice cores, Antarctic firn data, and archived air samples from Cape Grim, Tasmania D.M. Etheridge, L.P. Steele, R.J. Francey, and R.L. Langenfelds

Rapport from Division of Atmospheric Research, CSIRO, Aspendale, Victoria, Australia

(firn: rounded, well-bonded snow that is older than one year)

 (*) Valor Revisto

Graphic Edition/Edição Gráfica:
MAK
Editoração Eletrônic
a

Revised/Revisado:
Thursday, 05 May 2011
.

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