Economia & Energia
Ano II - No 10
Setembro/Outubro 1998

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Bolívia – Brasil

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MAK
Editoração Eletrônic
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marcos@rio-point.com
Revisado:
Friday, 18 July 2003.

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GASODUTO BOLÍVIA – BRASIL

Maria de Fatima Salles Abreu Passos
FatimaPassos@mpo.gov.br

 

RAZÕES DO PROJETO

A idéia de construir um gasoduto entre Bolívia e Brasil foi considerada em várias ocasiões, tendo sido objeto de discussão por quase meio século. Entretanto, por várias razões os diversos projetos não se apresentaram viáveis no passado.

Durante este período de negociações frustradas com o Brasil, a Bolívia passou a exportar gás para a Argentina. Entretanto, com o aumento significativo das reservas de gás natural, ocorrido a partir do final dos anos 70, a Argentina tornou-se auto-suficiente em gás, podendo prescindir do gás boliviano. As negociações entre Brasil e Bolívia começaram a tomar novo rumo com o final do contrato de importação de gás boliviano por parte da Argentina em 1992(1). A Bolívia é fortemente dependente da exportação de gás natural e, com a Argentina auto-suficiente no suprimento de gás natural, o Brasil aparece, naturalmente, como o principal mercado consumidor para o gás boliviano.

Não pretendemos aqui discutir as razões do insucesso das negociações entre Brasil e Bolívia no passado. Trataremos, sim, das razões que motivaram o projeto de importação atualmente em execução.

No final da década de 80, a importação de gás natural passou a ser uma imposição da sociedade, particularmente nas regiões Sul e Sudeste, onde a disponibilidade de gás nacional é inferior ao potencial do mercado. Destacam-se iniciativas do setor privado dos Estados do sul do país, como a constituição da INFRAGÁS, associação de potenciais consumidores de gás dos Estados do Paraná e Santa Catarina, que, antes mesmo da estruturação do projeto do gasoduto Bolívia-Brasil, começou a fazer estudos para importação de gás a partir da Bolívia e da Argentina. Também no Rio Grande do Sul, em diversas ocasiões, governo e setor privado consideraram a importação de gás das províncias vizinhas na Argentina. Em São Paulo foi constituída a Sociedade Privada de Gás – SPG, tendo como sócios algumas das maiores empresas do setor privado do Brasil, incluindo empreiteiras, indústrias de bens de capital e bancos, além de várias grandes empresas internacionais do setor energético. O principal objetivo da SPG era elaborar estudos de viabilidade para o projeto de gasoduto, sob a perspectiva do setor privado, de modo a garantir uma estruturação do projeto e uma estratégia de desenvolvimento comercial que pudessem atrair recursos do setor privado.

No início desta década, em resposta às demandas de setores da sociedade, o governo brasileiro concluiu análise completa das necessidades futuras de energia do País. O "Reexame da Matriz Energética Nacional" recomendava a elevação da participação do gás natural na matriz energética dos 2% em 1990, para no mínimo 4,5% em 2000 e 6 % em 2010. Posteriormente, a Comissão do Gás, criada em julho de 1991 com objetivo de propor diretrizes e indicar as ações a serem adotadas para viabilizar a maior utilização do gás natural, recomendou que a Secretaria Nacional de Energia deveria, entre outras providências, "promover as ações necessárias no sentido de viabilizar, técnica e economicamente, no menor prazo possível, a importação de gás natural da Bolívia, para o atendimento dos mercados dos Estados da Região Sudeste, da Região Sul e do Estado do Mato Grosso do Sul" e, também, que "a Petrobras deveria retomar os estudos para importação de gás da Argentina, via gasoduto, e de outras fontes sob a forma de gás natural liquefeito (GNL), visando a complementação da oferta nacional". O relatório da Comissão, que foi aprovado pelo Presidente da República em março de 1993, apresentava a meta de 12% de participação do gás natural no consumo de energia primária no Brasil em 2010.

A importação de gás da Bolívia apresentou-se como a melhor alternativa entre as opções consideradas para aumentar a oferta de gás no País, considerando-se, também, aspectos de política externa do Brasil e a possibilidade de integração futura com os campos produtores de gás da Argentina e o de Camisea no Peru.

O PROJETO

O gasoduto Bolívia-Brasil, hoje em construção, tem seu marco inicial na Carta de Intenções sobre o Processo de Integração Energética entre Bolívia e Brasil de novembro de 1991, assinada entre a Petrobras e Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) com participação do Ministério de Energia e Hidrocarbonetos da Bolívia, em La Paz. Nesta carta, as partes manifestam a decisão de chegar a um acordo para compra e venda de gás natural boliviano em um volume inicial de 8 milhões de m3/dia, com a previsão de alcançar 16 milhões de m3/dia, em função da evolução do mercado brasileiro e da disponibilidade de gás na Bolívia.

A partir desta Carta, o Governo Federal tomou medidas visando a viabilização do acordo. O Contrato de Compra e Venda entre Petrobras e YPFB foi, finalmente, assinado em 17/02/93. O contrato estaria em vigor desde sua assinatura, ficando sua eficácia condicionada à obtenção de financiamentos em condições que garantissem a viabilidade econômica do projeto.

A viabilização financeira do projeto não foi nada simples. Diversos aditivos ao contrato de 1993 foram assinados prorrogando prazos e, também, alterando o volume negociado. A prioridade dada pelo Governo, com a inclusão do projeto, em agosto de 1996, entre os 42 empreendimentos considerados prioritários no âmbito das ações governamentais - Programa Brasil em Ação, foi um aspecto importante para sua viabilização. Contudo, somente em julho de 1997, com esquema de financiamento já equacionado, foram assinados os contratos de construção e montagem do gasoduto.

Contrato de Compra/Venda de Gás Natural

A base do Projeto do gasoduto é o contrato de compra e venda entre YPFB e Petrobras, assinado em agosto de 1996 (último Aditivo ao Contrato de fevereiro de 1993), no qual a YPFB se compromete a vender e a Petrobras a comprar, em regime de take-or-pay, quantidades crescentes de gás, iniciando com 8 milhões de m3 por dia, atingindo 16 milhões de m3/dia, no oitavo ano e permanecendo nesse patamar até o vigésimo ano (TCQ - Transportation Capacity Quantity). Ainda no mesmo contrato a YPFB concede a Petrobras uma opção de compra, com preferência sobre terceiros, de quantidades adicionais de gás, provenientes ou não de novas descobertas bolivianas até o limite de 30 milhões de m3/dia, desde que tais quantidades estejam disponíveis e não sejam necessárias para atender à demanda do mercado doméstico da Bolívia(2).

TCO

Dentro da estrutura financeira do projeto foi criada uma opção de capacidade de transporte (Transportation Capacity Option - TCO), pela qual o comprador, pagando antecipadamente, poderia transportar gás numa faixa de 6 milhões de m3/dia, acima das quantidades contratuais, arcando apenas com os custos operacionais variáveis de transporte, inclusive com os custos de capital correspondentes aos investimentos em compressores adicionais para movimentar tal volume. Esta opção ficou disponível para todos os sócios do empreendimento até o começo da obra, quando então foi exercida pela Petrobras.

A negociação do TCO envolveu também Eletrobras e BNDES, sendo acordado que este volume adicional seria fornecido a usinas térmicas a serem instaladas, especialmente no Mato Grosso do Sul e São Paulo. A participação do BNDES se deu através de financiamento da compra antecipada da opção capacidade de transporte. Por meio deste financiamento, a Petrobras pode reduzir a tarifa de transporte de gás para um volume de 6 milhões de m3/dia destinado às termelétricas consideradas emergenciais pelo setor elétrico. O Plano Decenal de Expansão 1998/2007 da Eletrobras aponta um consumo de 4 milhões m3/dia de gás desta opção. Porém, conforme acordo entre Petrobras, Eletrobras e BNDES para a utilização do volume correspondente ao TCO, espera-se que o Mato Grosso do Sul consuma cerca de 2 milhões de m3/dia em duas usinas termelétricas, em Corumbá e Campo Grande, e que São Paulo seja responsável pelo consumo do restante do volume do TCO (4 milhões m3/dia) em termelétricas. O significativo aumento da demanda de gás pelo setor elétrico foi a motivação do financiamento do valor do TCO pelo BNDES.

TCX e TCY

Na terminologia adotada no Projeto, refere-se, ainda, como TCX - Transportation Capacity Extra, à capacidade de transporte acima dos volumes TCQ e TCO até atingir a capacidade de 30 milhões de m3/dia, ou seja, 6 milhões de m3/dia. Inicialmente esta capacidade não foi considerada na avaliação econômico-financeira do projeto, entretanto, a crescente demanda de gás natural motivou a contratação desta capacidade pela Petrobras.

O TCY é a denominação dada à capacidade adicional, além dos 30 milhões de média, que poderá ser obtida com novos investimentos no gasoduto. A contratação desta capacidade estaria aberta à negociação, dependendo de eventuais acordos entre fornecedores e consumidores de gás natural.

Estrutura Societária

Para construção e a operação do gasoduto foram constituídas duas companhias: uma do lado boliviano, a Gas Transboliviano S.A. - GTB e outra do lado brasileiro, a Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil S/A – TBG. Ambas empresas tem como sócios a Petrobras, através de sua subsidiaria Gaspetro - Petrobras Gás S.A. (Ex - Petrofertil); a BBPP Holdings Ltda, formada pela Broken Hill Proprietary Company - BHP, El Paso Energy e British Gas Americas Inc.; a Enron (Bolívia) C.V.; a Shell e Fundos de Pensão Bolivianos. As participações acionárias das duas empresas são apresentadas no quadro a seguir.

TBG

 

GTB

 

SÓCIOS

%

SÓCIOS

%

GASPETRO – PETROBRAS GAS SA

51

GASPETRO – PETROBRAS GAS SA

9

BBPP HOLDINGS LTDA

29

BBPP HOLDINGS LTDA

6

ENRON

7

ENRON

30

SHELL

7

SHELL

30

FUNDOS DE PENSÃO BOLIVIANOS

6

FUNDOS DE PENSÃO BOLIVIANOS

25

           Fonte:TBG

Estrutura de Financiamento

O investimento total no empreendimento é da ordem de US$ 2 bilhões, sendo US$ 1,6 bilhões no Brasil e US$ 400 milhões na Bolívia. O projeto conta com financiamento de quatro agências multilaterais de financiamento: Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento - BIRD (US$ 310 milhões), Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID (US$ 240 milhões), Corporación Andina de Fomento - CAF (US$ 80 milhões) e Banco Europeu de Investimento - BEI (US$ 60 milhões). Participam, também, do funding Agências de Crédito à Exportação, como BNDES/FINAME, Eximbank do Japão e Sezione Speciale Per l'Assicurazione del Credito all'Esportazione – SACE (US$ 404 milhões) e, ainda, o BNDES(3) (US$ 302 milhões).

GASODUTO

O Gasoduto Bolívia-Brasil terá aproximadamente 3.150 km de extensão, sendo 557 km do lado boliviano e 2.593 km em solo brasileiro. Inicia-se em Rio Grande, na Bolívia, com 32" de diâmetro, alcançando a fronteira com o Brasil no Mato Grosso do Sul (Puerto Suarez-Corumbá) e seguindo com o mesmo diâmetro até Campinas (1.258 km no trecho Corumbá - Campinas). Daí, divide-se em dois ramais principais com diâmetro de 24". O primeiro até Guararema (155 km), onde se interliga com o sistema de dutos da Petrobras (São Paulo - Rio de Janeiro - Belo Horizonte), e o segundo (1.180km) até Porto Alegre. A capacidade máxima do gasoduto será de 30 milhões de m3/dia. O fornecimento do gás ocorrerá em 37 city-gates, sendo que três estão sendo instalados no Mato Grosso do Sul e treze em São Paulo(4). As estações de compressão serão instaladas, gradativamente, na medida que se aumente o volume de gás transportado até que se atinja o total de 16 estações, sendo quatro na Bolívia e as restantes no Brasil.

TRECHO

DIÂMETRO

COMPRIMENTO

ESTAÇÃO DE

(polegadas)

(km)

COMPRESSÃO

Rio Grande/Puerto Suarez

32

557

4

Corumbá/Campinas

32

1258

10

Campinas/Guararema

24

155

Capinas/Curitiba

24

469

Curitiba/Florianópolis

20

281

1

Florianópolis/Criciúma

18

178

1

Criciúma/Porto Alegre

16

252

Total Brasil

2593

12

Total Bolívia

557

4

Total Geral

3150

16

Fonte:Gaspetro

O trecho Campinas-Guararema fará a ligação com outros gasodutos já existentes na Região Sudeste que ligam as Bacia de Campos e de Santos a centros de consumo no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Com a implantação do gasoduto Bolívia-Brasil, o país passará a dispor de um sistema de dutos interligados de aproximadamente 4000 km, além do sistema já existente no Nordeste.

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MERCADO

O gasoduto ligará os mercados de sete estados (MS, SP, MG, RJ, PR, SC e RS).

Inicialmente, previa-se que o gás importado da Bolívia seria consumido quase totalmente pela indústria. A possibilidade de déficit de energia elétrica, aliada a melhoria na eficiência da termelétricas, tornou o setor elétrico um grande mercado para o gás boliviano.

Diversos projetos de instalação de termelétricas ao longo do gasoduto estão sendo considerados em quase todos os Estados. Caso todos os projetos em análise se concretizem, grande parte do gás boliviano seria destinado à geração termelétrica.

O mercado potencial é superior à capacidade do gasoduto. As projeções mais conservadoras apontam demanda industrial de 20 milhões m3/dia para o início da próxima década, podendo chegar a 40 milhões m3/dia em uma perspectiva mais otimista, inclusive com co-geração de eletricidade pela indústria. Contudo, a idéia atual é que, num primeiro momento, as usinas termelétricas dêem sustentação ao projeto, funcionando como âncoras e, posteriormente, seja desenvolvido gradualmente o mercado industrial e, complementarmente, o uso automotivo do gás, principalmente em ônibus e táxis nas cidades abastecidas pelo gasoduto.

A distribuição do gás natural aos consumidores é de responsabilidade da companhias estaduais, tendo sido assinados contratos de fornecimento de gás entre a Petrobras e as seguintes companhias: COMGAS (SP), COMPAGAS (PR), SC Gás (SC), SULGAS (RS) e MS Gás (MS). A maior penetração do gás natural no setor industrial dependerá, fortemente, do ritmo de implantação da infra-estrutura de distribuição por parte das companhias estaduais. Pelo lado da demanda, o processo de adaptação do setor industrial dependerá da disponibilização de linhas de financiamento, que propiciem viabilidade econômica, além das vantagens operacionais geradas pelo uso do gás natural. Também, constitui fator de aceleração da demanda a adoção de uma política energética, voltada para o desenvolvimento sustentado que incentive os combustíveis menos poluentes.

  Maria de Fátima Salles Abreu Passos

Brasília, 10 de Setembro de 1998

(1) Embora o contrato de importação/exportação de gás entre Argentina e Bolívia tenha expirado em abril de 1992, a Argentina continua importando cerca de 6 milhões de m3/dia. Este comércio, que vem ocorrendo desde 1972, deverá se encerrar com o início da operação do gasoduto Bolívia-Brasil. Inclusive, prevê-se a inversão do fluxo do gasoduto que liga Bolívia à Argentina, que deverá ser utilizado para fornecimento de gás argentino ao mercado brasileiro.

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(2) A Petrobras já exerceu a opção de compra de mais 2 milhões de m3/dia de gás natural, desse modo o volume correspondente ao TCQ passa para 18 milhões m3/dia no oitavo ano.


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(3) Financiamento do TCO.


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(4) No tronco sul do gasoduto (Campinas-Porto Alegre) deverão ser instalados 13 city-gates e, ainda, o trecho norte (Rio Grande-Campinas) deverá receber outros city-gates.


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